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08 fevereiro 2011

Quantas vidas tem um guarda-redes?


Luvas. Como foi possível a opinião sobre os guarda-redes do Sporting e Benfica mudar tanto ao longo da época? Durante muito tempo viveram sob olhares desconfiados. Criticados e acusados. Na baliza do Benfica e Sporting, a análise aos dilemas existenciais de Roberto e Rui Patrício.


Quem conta a história é um homem velho, amargurado pela vida. Chama-se Barbosa, um brasileiro para quem a vida parou em 1950 quando estava, no Maracanã, na baliza do Brasil na final do Mundial contra o Uruguai. Perto do fim, deixou passar uma bola entre as mãos, foi golo e o Brasil perdeu o título. Nunca mais ninguém esqueceu. Ainda há poucos anos ele contava como uma vez, há pouco tempo, uma velha mulher com o seu pequeno neto pela mão o reconheceu numa loja e lhe disse apontando: "Olha, foi ele que fez chorar milhões de brasileiros..."

O guarda-redes é, por natureza, um jogador solitário. Ou melhor, um homem solitário. Um eremita das balizas. Até taticamente é ignorado. Fala-se em 4x4x2, 4x3x3, etc. Devia falar-se em 1x4x4x2, 1x4x3x3. A história eternizou, de forma romanceada, muitos desses casos existenciais com luvas e baliza. O futebol português também. Nos últimos tempos, dois seres das redes viveram esse drama. Olhares desconfiados, silêncios só cortados pelos murmúrios da bancada. Rui Patrício e Roberto, os guarda-redes eremitas do Sporting e do Benfica. Cada qual na sua casa, foram julgados (e condenados) sem pestanejar.

Rui Patrício chegou muito novo à baliza do Sporting. Foi uma aposta pessoal do treinador Paulo Bento, então em conflito com um guarda-redes sérvio Stojkovic que pouco antes chegara com rótulo de craque. Patrício entrou logo a defender um penálti mas os erros cometidos nos jogos seguintes levantaram uma montanha de críticas. Mesmo com os assobios a aumentar, o treinador aguentou-o no lugar. Nesses lances, os seus grandes planos revelavam um olhar assustado, mas essa não é a melhor forma de ler o pensamento de um guarda-redes. Porque encarou esses deslizes sempre de pé, olhar fixo no horizonte do meio-campo, pronto para outra batalha (entenda-se outra bola que ameace a baliza). Sempre que via essa imagem de Patrício recordava então a teoria de um antigo grande guarda-redes argentino, Amadeo Carrizo, que definia de forma sublime o grande guarda-redes com personalidade. Não, não era pelas grandes defesas. Dizia ele: "Para se saber a categoria de um guarda-redes, basta ver a sua reação após sofrer um golo. Se estão sentados, de culo, não servem. Se estão levantados, de pé, são bons".

Hoje, Rui Patrício parece quase um superguarda-redes. O segredo de 'estar no sítio certo' nunca é obra do acaso. É obra de um instinto trabalhado, antecipar trajetórias da bola e, depois, meter agilidade para voar para ela e travar-lhe o caminho. Um forte candidato a n.º1 da seleção de Bento, o único homem que acreditou nele no seu início de vida adulta entre os postes.

Roberto foi quase condenado, apontado como o culpado do mau início de época do Benfica. Os seus erros, falhas incríveis, dos primeiros jogos custaram pontos e levaram o mundo benfiquista a questionar o seu valor e a pressionar a sua saída. Inflexível, o treinador Jesus aguentou o seu guarda-redes de oito milhões de euros. Os tempos passaram e embora Roberto continue a denotar deficiências ao nível do timing de saída da baliza, com algumas hesitações, já afastou os olhares mais desconfiados. Algumas grandes defesas também ajudaram. O facto de a equipa ter começado a ganhar fez o resto. Em qualquer caso, porém, mesmo quando a bola lhe passava mesmo como se fosse uma tartaruga, encarou sempre, tal como Patrício, o julgamento de pé.

Apesar da tentativa de Camilo José Cela, que num conto de futebol inventou uma equipa que jogava com dois guarda-redes (guarda-redes direito e o guarda-redes esquerdo), no mundo real ele ainda continua o único dono da baliza. Barbosa, o mito desta história, morreu em 2000, com 79 anos. Em toda a carreira fez centenas de defesas. Nesse último dia de vida, porém, a bola que terá recordado foi a do golo de 50: "Recordo-me como se tivesse sido ontem. Já o revi centenas de vezes e tive que me justificar todas essas mesmas vezes. Todas as noites sonho com essa bola na minha direção e eu... deixo-a escapar e ela entra!". Perceberam agora do que se esteve a falar?
Craque em fuga?

O mercado aperta o cerco e os clubes portugueses não resistem aos ataques milionários. O Chelsea continua a sonhar com David Luiz. Um craque em fuga? Sem ele, o que pode acontecer à equipa do Benfica?

Além, claro, da qualidade individual do jogador, é interessante verificar que a influência de um defesa-central no jogo coletivo de uma equipa é hoje muito maior do que poderá parecer. Pode mudar a face da equipa em alguns traços do seu jogo. Ele não existe só para afastar a bola de perto da baliza e travar o avançado mais perigoso. Nos seus pés também está a capacidade de fazer a equipa avançar no terreno. Este fator varia conforme as características próprias de cada defesa. Um fator importante nesta análise é a velocidade. A forma mais visível disso se refletir no jogo tem que ver com a colocação mais adiantada ou mais recuada da linha defensiva.

Ou seja, com um defesa rápido como David Luiz o bloco da equipa (distância entre defesa e ataque) pode jogar mais subido no relvado, por força do posicionamento da sua defesa em terrenos mais adiantados, sem recear tanto deixar um maior espaço vazio (25/30 metros) nas suas costas, onde podem surgir avançados adversários, pois sabe que tem a velocidade dos seus defesas para reagir, recuperar e ir buscá-los. Sem essa velocidade, já não poderá arriscar tanto e passará a posicionar-se, por princípio, em espaços mais recuados. É deste posicionamento que nascem os termos técnicos 'bloco baixo' ou 'bloco alto'.

Se ficar sem David Luís (ou melhor, sem a sua velocidade) o Benfica terá tendência a defender mais atrás, mais perto da sua área. Para perceber melhor esta ideia, pensem no seu primeiro substituto, Sidney (muito mais lento), e imaginem-no a correr atrás de um veloz avançado isolado. Agora imaginem o mesmo com a velocidade de David Luiz. É muito diferente. Por isso, a defesa (e o bloco da equipa por consequência) terá de recuar alguns metros no seu posicionamento mais natural. O novo reforço Jardel também encaixa nesta mesma linha de pensamento.

Os caracóis de David Luiz têm maior reflexo na dimensão tática da equipa do que teria um simples defesa-central a cortar bolas por si só. Sem ele, o onze perderia o seu 'central-furacão'.
O espelho de Iturbe

É tentador imaginar o renascimento do génio. Já se perdeu a conta às anunciadas reincarnações de Pelé e Maradona. Todas falhadas. Nas últimas semanas, cheguei a ler que o FC Porto contratou um 'novo Messi'. O pibe mágico chama-se Iturbe, tem 17 anos e joga no Quilmes da Argentina. Não foram, diga-se, os responsáveis portistas a colocarem esse rótulo, mas a sua análise levou-o para esse campo da reincarnação do génio.

Mas que jogador contratou afinal o FC Porto? Villas Boas falou de um 'ala explosivo'. Pelo que nos últimos dias tenho visto dele no Sul-Americano Sub-20, é um bom princípio de análise. Canhoto como Messi, Iturbe gosta de jogar arrancando desde a ala. Não tem, no entanto, a magia de condução de bola em velocidade, com finta e remate no final. Parece, até, um pouco 'gordito'. Mais robusto, aguenta o choque, luta e joga, tenta a finta mas precisa afinar a inteligência desses movimentos. Ou seja, não o vi explosivo. Vi-o antes destemido. Choca demais. Esquiva-se de menos. Detetam-se, no entanto, muitas 'qualidades'. Falta saber se tem a 'qualidade' no geral para atingir a galeria mágica, mas falar em Messi neste contexto é uma heresia futebolística.

O processo de candidatura a génio do futebol tem, portanto, um novo nome. Iturbe já preencheu os papéis e espera a sua hora para, em campo, apresentar a sua tese com bola.
Adebayor, a girafa

Em Madrid, Mourinho já tem, por fim, o ponta-de-lança que tanto reclamava. O eleito 'possível' é o togolês Adebayor que estava sem jogar no Manchester City. Não é um fenómeno galáctico, mas tem um estilo (alto, esguio e passada larga) algo parecido ao lesionado Higuain. Está habituado à pressão a todos os níveis. Na última Taça de África, em Angola, ao chegar a Cabinda, foi um dos jogadores que tiveram de se esconder debaixo de um banco do autocarro que transportava a seleção do Togo enquanto esta era metralhado por rebeldes que acabaram por matar dois membros da comitiva. Ao lado disto, falar-lhe agora na pressão de jogar no Real Madrid nem faz sentido.

Principal dúvida: saber como combinará com os outros avançados, pois não é o tipo de jogador de equipa. Tem um ego enorme e gosta também de resolver as coisas por si próprio. Quando falha, em geral a culpa é do mundo que não o entende. Quando marca, a responsabilidade é dele, que é maior do que o onze.

Finalizador, tem melhor relação com o golo do que com o jogo. Fisicamente, pode parecer um 'bicho exótico', dando a ilusão que se vai desmontar todo a qualquer momento, mas isso nunca acontece. O mais natural mesmo é a bola acabar dentro da baliza. A girafa do Togo em Madrid.

1 comentários:

Só quem nunca viveu o futebol antes da temporada actual é que poderia duvidar da qualidade do Roberto. Elogios para o Patrício, sim, é um guarda-redes de luxo, ou não fosse ele meu vizinho de naturalidade ;)

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