Fora de jogo: O 'supersumo da batata'
Por João Bonzinho in A Bola
Já todos sabemos que o treinador do Benfica não possui propriamente o dom da oratória, e apesar de estar no lugar em que está também para falar, está, sobretudo, para treinar, matéria para a qual parece realmente ter dom, pelo que os benfiquistas não deixarão de lhe perdoar um outro pontapé na gramática, do mesmo modo que não deixarão de perdoar a Cardozo um ou outro pontapé na atmosfera. A este Cardozo devem os benfiquistas perdoar tudo, a este Jesus, por enquanto e enquanto ganhar, tudo os benfiquistas certamente perdoarão.
A verdade é que Jesus, por mais pontapés na gramática que se lhe detectem e por mais nervoso miudinho que a sua pastilha elástica provoque, parece estar a mudar definitivamente o ar da Luz, e talvez hoje, pela primeira vez em muitos anos, os benfiquistas tenham deixado de sentir saudades de um tal de José Mourinho, e daquela ideia sebastiânica de um dia o voltarem a ver de joelhos no relvado da Luz, festejando exuberantemente um qualquer golo ao Sporting.
Jorge Jesus não é fashion. Tem a imagem que Deus lhe deu e gosta, pelos vistos, dela, o que só lhe fica bem. Ainda o cabelo, apesar de grisalho, comprido, a chiclete mastigada de boca aberta, a camisa, de preferência em mangas, e aberta no colarinho, e alguma tendência para assumir, em particular, os seus próprios conflitos, como aconteceu esta semana quando teve de reencontrar-se com o mais polido, mas não menos corrosivo, Manuel Machado.
Aqui há anos (atrás, sim, atrás), os treinadores de futebol pareciam fazer gala de asumir que eram todos uns amigalhaços. Uns camaradas. Pela frente, claro. Por trás, não apenas se entretinham, muitas vezes, a dizer mal uns dos outros, como estavam sempre prontos a uma facadinha nas costas para ocuparem o respectivo lugar do morto.
Nem todos, felizmente, eram assim. É impossível esquecer o exemplo passado de Octávio Machado, que nunca deixou de gritar pela sua razão, mesmo num conflito público com Artur Jorge, com quem parecia ter relação sólida e indestrutível, e ao lado do qual (como seu adjunto) ganhou praticamente tudo o que podia ter ganho ao serviço do FC Porto, como hoje é impossível fingir que não existe um conflito aceso entre o agora seleccionador de Angola, Manuel José, e o agora seleccionador nacional, Carlos Queiroz.
Mas sejamos claros: os treinadores que mais incomodam são os que mais vencem. É assim com José Mourinho, é assim com Alex Ferguson (que está longe de ser um santo e tambem há anos mastiga pastilha elástica de boca aberta), é assim com Trapattoni, é assim com outros. Há os mais elegantes, sim: Ancelotti, Guus Hiddink, Lippi, Capello, Wenger. Mas nenhum deles pode afirmar-se imune ao conflito. Mourinho é o maior e nunca fugiu dele. Adora, aliás, uma boa picardia.
Poucos se lembrarão, mas já no tempo em que comandava as tropas portistas, Mourinho era um guerreiro: pelo gesto, pelo insulto, pelo gozo, pela ironia, ou pelo discurso directamente ao assunto. Nunca deixou de correr até aos árbitros auxiliares, de gritar contra os chefes destes, de provocar o banco adversário ou até de mandar calar o público. Uns apludem-no efusivamente, outros criticam-no severamente. Há os que o acusam, pouco originalmente, de ser um arrogante, há os que o defendem, pouco originalmente, como um excepcional irreverente.
O futebol tornou-se, pois, uma manta de detalhes. Só os mais atentos, os mais audazes, os mais espertos, e, em certa medida, os mais conflituosos chegam a vencer. A máquina e organização portistas são elogiadas há anos e há anos que assentam no conflito e na guerrilha.
A presença de Jorge Jesus no Benfica, o futebol espectacular que tem conseguido levar a equipa a apresentar e a facilidade com que ela chega, nos jogos em casa, a resultados que já não se usam, talvez andem a perturbar alguns adversários.
É verdade que no caso de Jesus, o modo como assume os seus conflitos é ainda uma faca de dois legumes, para utilizar uma expressão popularizada por um outro treinador de futebol. No Benfica, como em qualquer dos grandes, ganhar jogos não chega, é preciso ganhar títulos. Mourinho foi bicampeão nacional, campeão da Taça UEFA e da Liga dos Campeões, e campeão inglês num clube que não era campeão há 50 anos. Pode dizer quase tudo o que lhe apetecer.
Se Jesus continuar a ganhar só alguns jogos, terá um lugar no inferno à espera dele; se, pelo contrário, mostrar títulos, então o céu bem pode reservar-lhe a respectiva poltrona. Até lá, precisa de ter apenas algum cuidado.
Não lhe fica bem gozar em público na cara do treinador adversário (nem um treinador do Benfica o deve fazer) mas pode continuar a mastigar pastilha elástica à vontade. O mais importante é que se vê no campo.
É no campo que Jesus está a ganhar pontos e é no campo que qualquer treinador tem de mostrar se é ou não um vencedor. O resto é só o supersumo da batata.
Vamos Levar Com Isto Até à Exaustão
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*A COMUNICAÇÃO SOCIAL PORTUGUESA É XENÓFONA E CHAUVINISTA.*
Agora a "moda" é o treina-a-dor Ruben Amorim como treinador do Manchester
United FC.
*S...
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