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22 fevereiro 2010

Por cá e por lá



Por Fernando Seara in A Bola

1 Portugal vive um momento histórico complexo e perigoso. A autoridade do Estado parece ter sucumbido à praça pública que domina e condiciona pela sua frenética vozearia. A Polícia vive da coragem e do voluntarismo dos seus agentes, lutando em completa desigualdade contra fenómenos de criminalidade organizada e enfrentando uma lógica desculpabilizadora do infractor e responsabilizadora da acção repressiva que dela se espera. Os tribunais são quotidianamente desautorizados pela perspectiva primária de um justicialismo de pacotilha próprio de uma sociedade que troca os valores pelas emoções, a justiça pela paixão, a verdade pelo rumorejo. Seria um milagre que a Justiça Desportiva escapasse a esta onda avassaladora de desconfiança e incompreensão.

2 O Acórdão proferido pela Comissão Disciplinar da Liga sobre o Caso do Túnel da Luz constitui um exemplo de preocupação em alcançar a decisão justa. Será, certamente, criticável, como criticáveis são todas as análises de facto e todas as decisões de direito. Mas merece respeito e ponderação. São 122 páginas que reúnem uma fundamentação exaustiva na apreciação da prova, um estudo credível e apurado dos regimes legal e regulamentar aplicáveis, um labor indiscutível de coerência, de pormenor, de cuidado e de rigor. Foi objecto de deliberação unânime, sem oposições ou reservas. Consubstanciou uma condenação radicada em factos concretos e não em suposições ou deduções. Não é inexpugnável. Nenhuma sentença o é. Mas é um acto de seriedade e de competência. Pelos factos detalhadamente descritos e provados condena os jogadores do Futebol Clube do Porto que comprovadamente agrediram o agente de recinto desportivo, numa atitude que não poderia deixar de ser censurada. Como todos admitem e reconhecem. O que causaria espanto e perplexidade seria se, perante aquela situação, tal não acontecesse. Mais questionável já é a sanção aplicável ao Benfica, reconhecendo-se, por um lado, que em nada contribuiu, por acção ou omissão, para os acontecimentos e, por outro, imputando-se-lhe comportamento negligente. Incongruência dificilmente perceptível.

3 Mas de todos os factos em análise o que verdadeiramente se estranha é a omissão de qualquer sanção aos dirigentes do Futebol Clube do Porto que nada fizeram para impedir todo este lamentável episódio. Como se estranha que jogadores que assim se comportaram sejam objecto de homenagem interna, como se de vítimas se tratassem, e não alvo de sancionamento disciplinar interno por comportamento impróprio que lesou gravemente os interesses desportivos e económicos da sua entidade patronal. Ou seja, parece estar já a ser fabricado um discurso de justificação de insucesso, com base na velha teoria do inimigo externo, considerando que o mundo inteiro está contra o Porto clube, o Porto cidade e até, delirantemente, contra o Porto Região Norte. Este discurso é velho de décadas. Tem autor e rosto. Mas quando Pedroto treinava, o futebol era diferente, as SAD's não existiam e não estavam cotadas em Bolsa. Os interesses económicos tinham outro peso. Os empresários pouca influência. Os fundos de investimento nenhuma participação. Os direitos de transmissão televisiva inexistiam, com um só canal público. Por isso, tudo parece deslocado. Esta onda de pronunciamentos sobre o acórdão da Comissão Disciplinar, com algumas opiniões de ilustres juristas e até Doutores em Direito que podem ser contraditadas por outras de igual valor e idêntico quilate, esquece que o futebol carece também de autoridade e de respeito, principalmente quando em causa estão actos fundamentados, criteriosos e assumidos de rosto inteiro, sem subterfúgios nem jogos de espelhos. Tudo o resto, desde as declarações de jogadores até tomadas de posição de dirigentes, é um pouco mais de folclore neste mundo de demasiada cenografia.

4 Os jogos europeus disputados pelas equipas portuguesas foram o melhor contributo para o respeito pelos árbitros nacionais. O que se passou no Estádio do Dragão, em Liverpool, em Munique e em Berlim — entre os jogos que tivemos a oportunidade de ver — foram hinos à incompetência dos árbitros. Mas também vimos em Milão, num frente a frente entre dois colossos do futebol mundial, o AC Milan e o Manchester United, uma actuação competente, reconhecidamente competente, do quarteto português liderado por Olegário Benquerença. E que viu, até, Sir Alex Ferguson reconhecer a justeza da expulsão, por duplo cartão amarelo, do seu jogador Carrick. Constatamos, assim, que se fala mais alto, com voz mais forte e para consumo interno, nas desconfianças de actuações de árbitros, o que perturba, sem sombra de dúvidas, a credibilização de cada competição. É o que acontece entre nós, tal como em Espanha ou em Itália. Mas se aquilo que todos vimos, quer na Liga dos Campeões, quer na Liga Europa, tivesse ocorrido na Liga portuguesa, meu Deus, cairia o Carmo e a Trindade. Decorrendo sob a égide da UEFA, tudo passa com um vago lamento… É o nosso fado. Mesmo nosso. Só nosso.

5 Por cá, discutimos a disciplina, as arbitragens e outras questões que nos abalam a emoção e perturbam a paixão. Por lá, lá por fora, vemos e calamos. Calamos mesmo. Mas, hoje, não podemos deixar de endereçar uma imensa palavra de solidariedade à Madeira pela tragédia que a atingiu. O desporto, todo o desporto português, deve desencadear um abraço imenso. Um imenso abraço de solidariedade.

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