A classe do Porto

Por Miguel Góis in Record

Devo dizer que não podia estar mais em desacordo com os analistas que anteveem um forte clima de tensão e frequentes picardias no Benfica-FC Porto do próximo domingo. Arrisco uma previsão contrária: depois do ambiente nos estádios do Sp. Braga e do Olhanense, o confronto com o FC Porto vai ser um amigável. É a idiossincrasia deste campeonato - este ano, o Benfica deve olhar mais para os papistas do que para o Papa. Até porque, desde o início da época, o Porto deixou de ser a capital nacional da intimidação. Tal como as mais bem geridas multinacionais, o FC Porto deslocalizou - passou-se a fabricar climas intimidatórios em Braga e Olhão. Em contrapartida, o FC Porto é, hoje em dia, um clube de cavalheiros.

É neste contexto que - e custa-me escrever isto - o Túnel das Antas se tornou obsoleto. É um testemunho de horrores passados, como as trincheiras de Verdun. É um monumento, que deve ser deixado aos arqueólogos, que com sorte encontrarão, daqui a umas décadas, três molares do João Vieira Pinto soterrados no local, juntamente com uma soqueira do Paulinho Santos.

Os tempos são outros. Tomemos o exemplo da atitude de Jorge Costa, cuja amabilidade pudemos testemunhar durante a transmissão do Olhanense-Benfica: insultou Javi García, não em português, como faria um vulgar carroceiro, mas sim na língua materna do jogador. Tentem colocar-se por momentos na pele do espanhol: por um lado, o que aquele senhor está a insinuar sobre a profissão da nossa progenitora é ligeiramente desagradável; mas, por outro, eis que no estrangeiro alguém se dirige a nós na nossa língua e, nem que seja durante uns segundos, sentimo-nos outra vez em casa, como se nunca tivéssemos abandonado o nosso país de origem. Estou ansioso que o Benfica compre um jogador francês, só para obrigar o Jorge Costa a matricular-se na Alliance Française.

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