Coisa simples

Por Miguel Cardoso Pereira in A Bola

AS coisas só são fáceis ou difíceis depois de passarem por nós, de as transformarmos numa coisa ou noutra. À partida, quando se nos deparam, não são o quer que seja, são ar antes de vento. Creio ser isto que, pelo menos no desporto, separa povos do Norte da Europa dos do Sul. Avaliamos de mais os jogos antes de os fazermos. Só não tem sido assim com o FC Porto dos últimos anos e dias. No resto, há tendência dos maiores e mais fortes para jogos fáceis mal resolvidos, como o do Benfica em Olhão. Foi bom exemplo. Se para alemães ou holandeses nada é fácil à partida e tudo parece fácil depois de feito, os portugueses no geral acham que só o difícil os testa verdadeiramente. Pessoas, clubes, selecções, políticos, empresas… E, creio, não o fazem por pensar pouco nas coisas, antes por as pensarem de mais e as fazerem de menos. Isto em teoria.
Agora um exemplo de como a simplicidade nos perturba. Inventaria melhor mas este aconteceu-me realmente em conversa. Sobre tema tão central como a pastelaria.

— Deixa-me contar: não gosto de palmier simples! — disseram-me.

— Pede um pastel de nata.

— Não é isso, não gosto do palmier simples como desafio, é um bolo que não me estimula. É duma simplicidade confrangedora. Sinto-me capaz de comer um bolo com outra importância.

— É simples porque sem creme…

— Com creme devia chamar-se palmier complicado, que achas?

Nada. Acho só curiosas as questões que a simplicidade nos levanta. Só nos motivamos com heroísmos e missões impossíveis. As possíveis que façam outros. Fazer bem o fácil é difícil para nós.

Amanhã há Benfica-FC Porto. Ganhará quem, hoje, pensar que o jogo não será fácil nem complicado. Será apenas. É por acaso que os verbos facilitar e complicar significam, em português, a mesma coisa?

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