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29 setembro 2009

Entrevista a Freddy Adu

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Freddy Adu: "Ninguém vai ser Pelé"

in ionline.pt

Visita ao Restelo e à vida real de uma estrela inventada aos 14 anos. "Era como um circo"

No parque de estacionamento do Estádio do Restelo, Freddy Adu passa por um dos elementos do staff do Belenenses, debruçado sobre a janela de um carro, dá-lhe uma palmada e diz-lhe: "Belo corpinho!" A brincadeira sai em português e começa a defini-lo: aos 20 anos continua a ser um miúdo bem disposto e confiante, apesar do impasse numa carreira que se projectou bem diferente.

Vê-se que está contente no Belenenses.
Muito. É uma nova oportunidade, toda a gente está a ser fantástica, estão a dar- -me uma oportunidade e isso é tudo o que preciso nesta altura. É um ano muito importante, talvez o mais importante da minha carreira porque quero fazer parte da selecção dos Estados Unidos que estará no Mundial. Ainda por cima é na África do Sul.

Nunca regressou a casa?
Estive na África do Sul, estive em Angola com o Benfica, mas nunca voltei ao Gana, o que é triste. Tenho de lá voltar.

Como foi a sua infância?
Jogava futebol todos os dias, via o Zidane e o Ronaldo na TV e tentava jogar como eles.

Teve uma oportunidade extraordinária de ir para os Estados Unidos, devido a uma lotaria; era o sonho de qualquer um mas teve um efeito perverso: fez disparar a carreira muito cedo. Concorda?
Não fui para o Estados Unidos pelo soccer, fui por uma vida melhor e pela escola. Hoje sinto-me abençoado por tudo o que me aconteceu... é que eu nem sequer queria ir para a América, tinha sete anos e fartei-me de chorar, não queria deixar a malta com quem jogava à bola.

Mas o contrato profissional aos 14 anos, os contratos publicitários, tudo isso não foi demasiada pressão num miúdo?
Muitos dizem que sim, mas eu senti-me preparado para ser profissional e poder ajudar a minha mãe financeiramente. A minha mãe tinha dois empregos, tomava conta de dois miúdos sozinha!

A maior parte dos miúdos pensa em tudo menos em sustentar a família.
Tive de crescer muito depressa, ser homem muito cedo. A minha vida não era normal, nenhum miúdo de 14 anos é profissional com tanto dinheiro, é muita coisa... cumpri um sonho mas sacrifiquei a vida social.

O que faria de diferente?
Houve muita coisa... o aparecer, a publicidade... oxalá tivesse dito "não" algumas vezes, porque tudo aquilo me retirou o futebol, a alegria de jogar. Passou a ser de mais, era como um circo... viagens, falar aqui e ali, quando chegava a altura de jogar estava cansado.

Pensava que tudo seria fácil?
Achei que tudo aquilo não custava nada [risos]! Achei que ser um atleta profissional era apenas ir para dentro do campo e jogar, como sempre fiz. Mas claro que é diferente.

E na Europa não é ainda mais difícil?
É muito mais! Venho para Europa - aí está o miúdo, grande nome, todos conhecem - e tenho de trabalhar três vezes mais para ter uma oportunidade de jogar. Porque [abranda o discurso e levanta a voz] toda a gente tem muita qualidade! E depois, se me descuido saio da equipa, se saio, espero, espero, espero por outra oportunidade.

A ideia que se criou em torno de si foi esta: o miúdo é o novo Pelé.
Foi pressão a mais. As pessoas esperavam que entrasse em campo e marcasse três golos em todos os jogos. Não, ninguém vai ser Pelé, não vai haver nenhum Pelé, Pelé é único. E Maradona é Maradona, por aí fora. O que posso fazer é trabalhar para evoluir, porque sinto que tenho talento. No fim, a questão resume-se a trabalho.

Quando se estreou no Benfica [FC Copenhaga, Liga dos Campeões, no Estádio da Luz] deu a ideia de que não estava preparado para aquilo.
Estava superexcitado e motivado mas também nervoso. Pensava: "Bom, isto é um mundo novo, nunca pensei que fosse assim. Olhei à volta no Estádio da Luz, umas 60 mil pessoas nas bancadas, uau!!!" Não sabia o que me esperava mas depois desse jogo acalmei.

Fernando Santos apoiou-o?
Sim, foi quem me trouxe para o Benfica, acreditou em mim mas depois foi despedido e veio Camacho, que trouxe jogadores como Maxi e Rodríguez; o Rodríguez veio para jogar na posição que podia ser minha, cada treinador tem as suas escolhas; comecei do zero.

Surpreendeu-o a entrada e saída de jogadores, a troca de treinadores?
Nos Estados Unidos não era assim. Aqui é sempre gente nova, novos jogadores e treinadores, especialmente no Benfica, onde tive três treinadores num ano. São estilos de jogo diferentes, mentalidades distintas, treinos diversos... senti que foi de mais. Mas mesmo com Camacho joguei e marquei golos. Foi bom. Depois fui para a selecção sub-20 dos Estados Unidos, fiz três golos em quatro jogos e quando regressei o treinador já era Chalana. E não joguei mais.

Acha que tinha lugar no Benfica?
Sim, definitivamente. Mas não faz sentido dizer qualquer coisa agora porque a equipa está a jogar muito, todos parecem estar melhor. Di María melhorou muito, Coentrão também. Um treinador pode fazer-te ou acabar contigo, é bom que eles tenham um treinador que acredita neles, que lhes dê oportunidades. No Mónaco também joguei pouco e quando isso acontece perde-se a forma. São precisos quatro ou cinco jogos para recuperar. Só quero uma oportunidade de mostrar como estou muito melhor.

Fazia vida de príncipe do Mónaco?
Era bom, está lá todo o tipo de gente, conheci várias pessoas. Além disso, a minha mãe esteve lá comigo duas semanas.

A sua mãe ainda lhe deixa o congelador cheio de comida?
Sim, veio agora a Portugal e fez o mesmo.

Que comida?
Comida ganesa, guisados, vegetais, arroz, muita carne.

Quantos frigoríficos tem em casa?
Vou ter dois [gargalhada]. Mas este ano ela virá mais vezes, é a mulher mais importante da minha vida. Mas atenção que adoro a vossa comida, o vosso peixe, hum... que peixe!

E quando ela não está?
Tenho amigos. O meu melhor amigo é moçambicano, conheci-o quando cheguei e fui ao Colombo comprar um telemóvel; ele percebeu que estava desorientado e ajudou-me; seis meses mais tarde descobri que nascemos no mesmo dia e no mesmo ano! É a coisa mais estranha que já me aconteceu.

E uma namorada, como nos Estados Unidos [namorava com Jojo, uma cantora]?
Não, não, aqui não. Ando por aí... o futebol é a minha namorada.

E o seu pai?
O meu pai? Não falo com o meu pai desde os oito anos [deixou a família].

Sente a falta dele?
Nunca deu sinal, nunca nos contactou nem nós a ele; também acho que a minha mãe nos protegeu, sempre quis que nos concentrássemos na escola, preferiu que não nos chegasse qualquer problema.

Quem é o melhor jogador em Portugal?
Neste momento? Quando cheguei era o Quaresma, de longe! Este ano, diria Cardozo, Aimar, Saviola, Hulk ou Rodríguez.

Ainda acha que os jogadores americanos são olhados de lado na Europa?
Quando vem alguém da América dizem logo: "Não deve ser grande coisa." Provei que estavam enganados; achavam que o futebolista americano é grande e duro, mas eu sou o oposto, sou pequeno, rápido e técnico. Falo com colegas da selecção que sentem o mesmo. Somos mais do que um bando de jogadores de basebol.

Sente saudades?
Da América? Oh, todos os dias! É casa! Mas sei que preciso de fazer sacrifícios, tenho 20 anos, tenho tempo e sei que tenho de estar na Europa: aqui estou a um segundo de tudo o que quero.

Gana, Estados Unidos, Mónaco, Portugal. Onde estará daqui a dois anos?
Em dois anos imagino-me em Inglaterra ou Espanha. São as melhores ligas do mundo, sempre foram o meu objectivo, sinto que são o meu destino. Sei que tenho de dar tudo, preparar o meu corpo, treinar, mas se jogar vou lá chegar.

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