NO futebol português, muito se fala da estrutura. Um entorno que emoldura, protege e cria condições para o treinador trabalhar, aplicando as suas ideias, cruzando-as com as do clube. Dizem que é decisivo para (poder) ganhar. É verdade. Mas não é tudo. E, muitas vezes, há casos que parecem inverter esta lógica. Ou seja, é o treinador que condiciona a estrutura. Não é, no entanto, natural (nem saudável) isto suceder.
Jorge Jesus criou um impacto tremendo no mundo benfiquista. Desde o aparecimento de Mourinho no FC Porto que um treinador, por si só, não era tão decisivo para mudar o rumo e a face de um clube. No fundo, a sua influência tornou-se maior do que a estrutura que era a mesma nas épocas anteriores. No caso do FC Porto, porém, tratava-se de uma conjuntura muito concreta. Mourinho tornou-se, pelo seu saber e estilo, maior do que a estrutura mas nunca a absorveu. Isto é, depois dele, ela continuou lá. Granítica. Após o choque inicial da sua saída, outros treinadores vieram, outros treinadores ganharam.
No caso do Benfica, é diferente. O treinador mudou a estrutura. Ou melhor, mudou a visão e imagem da estrutura. Absorveu-a até toda ela se confundir com ele. Até ser impossível imaginá-la sem ele. Só os grandes treinadores conseguem isto: mudar a realidade em vez de se adaptar a ela. Por isso, este título benfiquista de 2010 nada tem a ver com o de 2005. Aquele percebera-se que fora um feito circunstancial. Este pode significar um abrir de um novo ciclo de correlação de poderes no futebol português. Existe, porém, um factor que o pode ameaçar. A dimensão (importância) do treinador em todo este processo. É este o ciclo de Jesus ou é o ciclo do novo Benfica? Resistirá a estrutura sem o treinador que esta época a mudou?
Num mundo futebolisticamente saudável, nenhum treinador pode ser muito maior do que a estrutura até ao ponto de ela não existir (ou perder eficácia) sem ele. Nesta hora de vitória, penso que esta questão é decisiva para projectar o tal novo ciclo que o Benfica quer abrir. Até porque, já se entendeu, Jesus tem ambições (legitimas) de treinar (e ganhar) no estrangeiro.
A próxima época (com Jesus e a Champions) é, por isso, um espaço temporal decisivo para o clube solidificar ideias e personalidade. Cimentar a estrutura para além do treinador, sem prescindir, claro, da sua influência nessa construção. Um processo, nesse aspecto, respeitando as idiossincrasias benfiquistas muito próprias, semelhante ao do FC Porto (seria possível Jesualdo ter ganho três campeonatos consecutivos noutro clube?). É óbvio que, mesmo em clubes com estrutura forte, os treinadores não são todos iguais. Uns são melhores do que outros (umas tácticas dão certo, outras não). Para o treinador, é fantástico sentir que ganhou e fez ganhar a equipa. Para o clube, depois dos festejos, é preocupante perceber que, sem ele, tudo teria sido diferente. É este o grande triunfo de Jesus no Benfica. Mudou-lhe o destino e... ficou com ele nas mãos.
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