Desconfio que Jorge Jesus saltou a minha última crónica. Sim, desconfio seriamente disso. Como é que é, mister? Eu venho para aqui falar de “quatro ou cinco golaços em Alvalade” e depois o espectáculo dá naquilo? Até parece mal, caramba.
Com uma coisa os meus amigos sportinguistas concordarão, não tenho dúvidas: o jogo foi assim bastante para o chatinho. É o pior dos resultados, o nulo, uma espécie de monumento antifutebol, quase sempre. Claro que houve dois ou três perigos para cada lado – aquele chuto do Miguel Veloso que o Quim desviou do ângulo da nossa baliza com uma mão magnífica, aquela precipitação do Di María no irrepetível instante do remate –, mas a impressão geral com que fiquei foi a de uma partida de nervo, esforço, suor e sangue. Sangue, pois, e não é literatura: lembremo-nos da cabeça de Javi García. Essa imagem do nosso trinco espanhol no fim do jogo – uma ligadura a atar-lhe os pensamentos, o sangue benfiquista pintando-lhe metade da cara – ergue-se, aliás, como o cromo mais eloquente do dérbi. Como é que é o ditado, “uma imagem vale mais que dois mil e tal caracteres”?
O que vale é que hoje temos uma bela ocasião para mudar a música. Assim, permitam-me mandar duas ou três ideias para a caixa de sugestões do mister Jesus. É muito rápido, vão em forma de telegrama, a voar daqui até à Bielorrússia.
Defender mais à frente stop nº10 mais protegido mais espaço para pensar stop arranjar soluções desdobráveis para quando nº10 está mais policiado stop Di María que prove da psicologia do banco de suplentes a ver se lhe passa desconcentração dos Man Citys deste mundo stop pôr Coentrão de início stop e pergunta não é altura de nova oportunidade para Shaffer stop.
O discurso está todo muito certo – Javi diz que vamos lá para ganhar, Ramires explica que não há desculpas –, agora só falta aquele milagre que vem dos começos da humanidade e que se chama “teatro”. Não, não estou a sugerir que se atirem para a piscina mal sintam um soprozinho nas canelas em plena área dos borisovs. Digo “teatro” no sentido próprio do termo. Arte de dar gestos às palavras, corpo às frases, milagre de pegar num texto, num sonho, e dele fazer nada menos do que a verdade.
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