Lamentavelmente, satisfazem-se com pouco
Por Leonor Pinhão in A Bola
Dois benfiquistas, grandes amigos, um optimista e outro pessimista, encontraram-se não importa onde e muito menos a que horas. O que importa é que sendo tão amigos, e ainda por cima adeptos do mesmo clube, manifestaram-se quase sempre em total desacordo com as opiniões um do outro. A tal ponto, que quase terminaram agastados a conversa com que se entretiveram durante uns pouco e contrariantes minutos.Como é natural e sempre acontece — …quem o não sabe por experiência própria? — foi o amigo pessimista que abriu o colóquio, irritando logo o seu interlocutor com uma tirada sombria:
— A jogarmos assim não vamos a lado nenhum!
Não tendo decorrido nem 24 horas sobre o último jogo do Benfica, cujo resultado final se traduziu nuns expressivos e raros 8-1, o agouro caiu muitíssimo mal no amigo optimista que passara o dia inteiro a ver no pequeno ecrã o resumo do jogo com o Vitória de Setúbal.
Embevecido, incapaz de se levantar do sofá, numa maratona sentada de noticiários de hora a hora, o optimista já assistira por 14 vezes ao resumo da goleada e ainda não se cansara. Literalmente, só saiu de casa para comprar cigarros e encontrar, por obra do destino, o seu amigo pessimista a quem censurou vivamente o fatalismo dando-lhe o exemplo do seu próprio entusiasmo compulsivo em frente à televisão.
— Só de ontem para hoje já vi 112 golos do Benfica! — disse julgando que, desde modo aritmético, encerrava a questão. Enganou-se redondamente.
— Então viste também o Benfica sofrer 14 golos de ontem para hoje, ou não viste?
— Não vi porque mudo de canal assim que chega aos 8-0 e fico à espera do próximo noticiário.
— Não temos defesa, não temos guarda-redes! Aquela saída do Quim, francamente…
— Não há guarda-redes que te satisfaça. Olha, neste sábado vi o Bayern de Munique-Wolfsburgo na televisão e sabes quem é o guarda-redes titular do Bayern? É o Butt que no ano passado esteve no Benfica e que tu achavas um grande frangueiro.
— Tu não percebes que o guarda-redes do Benfica tem de ser muito melhor do que o guarda-redes do Bayern de Munique?
— E não pode ser igual?
— Não, não pode.
— Mas não gostaste nem um bocadinho do jogo com o Vitória de Setúbal? Não jogámos bem?
— Gostei de vinte minutos, o resto foi uma porcaria. Aliás, as nossas segunda partes são vergonhosas. A equipa desacelera, desconcentra-se, sofre golos incríveis… O Jorge Jesus, de facto, está-me a desiludir muito!
— Francamente, jogámos muito bem na segunda parte com o Setúbal!
— Olha, a segunda parte com o Poltava, lá na Ucrânia, foi o pior Benfica que vi nos últimos dez anos.
— Pior do que aquele jogo em que fomos eliminados da Taça de Portugal, na Luz, pelo Gondomar?
— Muito pior! Aquele David Luiz pode ser um defesa central razoável, mas como lateral-esquerdo, que horror…
— Mas, pelo menos, não achas que estamos melhor do que na época passada?
— Quanto muito… estamos exactamente na mesma. E dou-te o exemplo do jogo com o Vitória de Setúbal, foi igualzinho ao do ano passado…
— Que disparate!
— Disparate? Este ano voltámos a sofrer um golo ridículo nos últimos segundos do jogo.
— Mas no ano passado só estávamos a ganhar por 2-1 e empatámos e este ano já tínhamos marcado 8 golos…
O amigo pessimista levou as mãos à cabeça num gesto de grande preocupação e disse em voz muito baixa, quase inaudível:
— Lamentavelmente, satisfazem-se com pouco.
— Nem sequer ficaste contente por o Cardozo ter conseguido marcar um golo de penalty?
— Não. Devia ter falhado para os árbitros continuarem a marcar penalties a nosso favor. Sempre era uma garantia que tinham… a partir de agora não sei o que se vai passar.
— Estamos imparáveis nos lances de bola parada. Vê-se que há ali muito treino. Contra o Vitória marcámos dois golos de canto, um golo de livre…
— Tu não estás a ver o perigo que isso significa? Tu não percebes que é precisamente por aí que os árbitros nos vão arrumar? Tu não vês que se continuamos a marcar golos de bola parada qualquer dia não há um árbitro que se atreva a marca uma falta a favor do Benfica?… Isto é terrível! É que os nossos livres do presente arriscam-se a transformar-se nos nossos penalties do passado, uma roubalheira, está dito e escrito!
— Sim, és capaz de ter razão, mas acho que, pelo menos, os árbitros hão-de ter coragem para marcar os pontapés de canto a nosso favor até porque, normalmente, são lances mais óbvios…
— Qual quê? Passa tudo a pontapé de baliza! Eu assim que vi naquele canto, o Javi García dar aquela cabeçada…
— … magnífica!
— Desculpa, foi uma cabeçada vulgar! Mas assim que vi a bola entrar na baliza arrepelei-me todo e pensei: isto vai ser um sarilho para os árbitros marcarem cantos a nosso favor…
O optimista, que começava a ficar preocupado, deu voltas à cabeça para arranjar um novo tópico. Por fim, saiu-se com esta:
— O que é que achas do Jorge Jesus ter comparado o campeonato português ao italiano?
— Acho que o Jorge Jesus não percebe nada disto. São dois campeonatos em que há notícias pormenorizadas sobre corrupção, isso é verdade, mas são campeonatos completamente diferentes porque em Itália os grandes, médios e pequenos descem de divisão e o pessoal até vai de cana. Não dá para comparar…
— Por falar em comparações, adoro o Ramires. Faz-me lembrar o Valdo.
— Só se for por ser brasileiro!
— Não falo mais contigo! És um estraga prazeres, adeusinho.
— Adeusinho e vai para casa ver o resumo outra vez… No Restelo é que vão ser elas, ah pois!
A conversa terminou, assim, de modo tão desabrido que o optimista até se esqueceu de comprar cigarros. Mas como é optimista não se ralou nada com isso.
Não tendo decorrido nem 24 horas sobre o último jogo do Benfica, cujo resultado final se traduziu nuns expressivos e raros 8-1, o agouro caiu muitíssimo mal no amigo optimista que passara o dia inteiro a ver no pequeno ecrã o resumo do jogo com o Vitória de Setúbal.
Embevecido, incapaz de se levantar do sofá, numa maratona sentada de noticiários de hora a hora, o optimista já assistira por 14 vezes ao resumo da goleada e ainda não se cansara. Literalmente, só saiu de casa para comprar cigarros e encontrar, por obra do destino, o seu amigo pessimista a quem censurou vivamente o fatalismo dando-lhe o exemplo do seu próprio entusiasmo compulsivo em frente à televisão.
— Só de ontem para hoje já vi 112 golos do Benfica! — disse julgando que, desde modo aritmético, encerrava a questão. Enganou-se redondamente.
— Então viste também o Benfica sofrer 14 golos de ontem para hoje, ou não viste?
— Não vi porque mudo de canal assim que chega aos 8-0 e fico à espera do próximo noticiário.
— Não temos defesa, não temos guarda-redes! Aquela saída do Quim, francamente…
— Não há guarda-redes que te satisfaça. Olha, neste sábado vi o Bayern de Munique-Wolfsburgo na televisão e sabes quem é o guarda-redes titular do Bayern? É o Butt que no ano passado esteve no Benfica e que tu achavas um grande frangueiro.
— Tu não percebes que o guarda-redes do Benfica tem de ser muito melhor do que o guarda-redes do Bayern de Munique?
— E não pode ser igual?
— Não, não pode.
— Mas não gostaste nem um bocadinho do jogo com o Vitória de Setúbal? Não jogámos bem?
— Gostei de vinte minutos, o resto foi uma porcaria. Aliás, as nossas segunda partes são vergonhosas. A equipa desacelera, desconcentra-se, sofre golos incríveis… O Jorge Jesus, de facto, está-me a desiludir muito!
— Francamente, jogámos muito bem na segunda parte com o Setúbal!
— Olha, a segunda parte com o Poltava, lá na Ucrânia, foi o pior Benfica que vi nos últimos dez anos.
— Pior do que aquele jogo em que fomos eliminados da Taça de Portugal, na Luz, pelo Gondomar?
— Muito pior! Aquele David Luiz pode ser um defesa central razoável, mas como lateral-esquerdo, que horror…
— Mas, pelo menos, não achas que estamos melhor do que na época passada?
— Quanto muito… estamos exactamente na mesma. E dou-te o exemplo do jogo com o Vitória de Setúbal, foi igualzinho ao do ano passado…
— Que disparate!
— Disparate? Este ano voltámos a sofrer um golo ridículo nos últimos segundos do jogo.
— Mas no ano passado só estávamos a ganhar por 2-1 e empatámos e este ano já tínhamos marcado 8 golos…
O amigo pessimista levou as mãos à cabeça num gesto de grande preocupação e disse em voz muito baixa, quase inaudível:
— Lamentavelmente, satisfazem-se com pouco.
— Nem sequer ficaste contente por o Cardozo ter conseguido marcar um golo de penalty?
— Não. Devia ter falhado para os árbitros continuarem a marcar penalties a nosso favor. Sempre era uma garantia que tinham… a partir de agora não sei o que se vai passar.
— Estamos imparáveis nos lances de bola parada. Vê-se que há ali muito treino. Contra o Vitória marcámos dois golos de canto, um golo de livre…
— Tu não estás a ver o perigo que isso significa? Tu não percebes que é precisamente por aí que os árbitros nos vão arrumar? Tu não vês que se continuamos a marcar golos de bola parada qualquer dia não há um árbitro que se atreva a marca uma falta a favor do Benfica?… Isto é terrível! É que os nossos livres do presente arriscam-se a transformar-se nos nossos penalties do passado, uma roubalheira, está dito e escrito!
— Sim, és capaz de ter razão, mas acho que, pelo menos, os árbitros hão-de ter coragem para marcar os pontapés de canto a nosso favor até porque, normalmente, são lances mais óbvios…
— Qual quê? Passa tudo a pontapé de baliza! Eu assim que vi naquele canto, o Javi García dar aquela cabeçada…
— … magnífica!
— Desculpa, foi uma cabeçada vulgar! Mas assim que vi a bola entrar na baliza arrepelei-me todo e pensei: isto vai ser um sarilho para os árbitros marcarem cantos a nosso favor…
O optimista, que começava a ficar preocupado, deu voltas à cabeça para arranjar um novo tópico. Por fim, saiu-se com esta:
— O que é que achas do Jorge Jesus ter comparado o campeonato português ao italiano?
— Acho que o Jorge Jesus não percebe nada disto. São dois campeonatos em que há notícias pormenorizadas sobre corrupção, isso é verdade, mas são campeonatos completamente diferentes porque em Itália os grandes, médios e pequenos descem de divisão e o pessoal até vai de cana. Não dá para comparar…
— Por falar em comparações, adoro o Ramires. Faz-me lembrar o Valdo.
— Só se for por ser brasileiro!
— Não falo mais contigo! És um estraga prazeres, adeusinho.
— Adeusinho e vai para casa ver o resumo outra vez… No Restelo é que vão ser elas, ah pois!
A conversa terminou, assim, de modo tão desabrido que o optimista até se esqueceu de comprar cigarros. Mas como é optimista não se ralou nada com isso.
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