1. Tal como para o país se pedem reformas, também no futebol se sente a necessidade do país. Sentir não é sinónimo de ter vontade de fazer ou, até, de fazer mesmo: no futebol, é igualmente endémica a distância entre o que deve ser feito e o que é feito. No contexto do que é estrutural, alguns problemas (desafios) surgem aos meus olhos como mais evidentes. Um deles é o fosso entre os clubes grandes e os pequenos e médios clubes (PMC).
2. É pernicioso para o futebol profissional não termos uma “classe média” de clubes, forte e sustentada. Temos exemplos de médios que chegaram a ser “grandes” e até campeões e vencedores de competições. Mas não temos, nem nunca tivemos, um conjunto considerável de clubes que se desenvolvessem continuadamente, que, com estabilidade, trouxessem adeptos e receitas, que brigassem com os grandes por posições e lhes retirassem os protagonismos. Clubes que fidelizassem simpatias regionais – como acontece de há muito com o Vitória de Guimarães – e concentrassem os investidores económicos. Alguns desses de que nos lembramos foram até projetos “pessoais” que arrastaram a convicção dos adeptos, projetos assentes na capacidade económica e/ou carismática do “presidente” (e seus próximos), bem como do apoio das autarquias. Com a sua queda ou saída e as dificuldades financeiras dos municípios, alguns ficaram clubes “órfãos”, “adiados” ou “perdidos”. Outros resistiram e, diferentes, seguiram por outro lado. O caminho não é, a meu ver, por aí. Hoje por hoje, a fórmula é adeptos e receitas, com dirigentes capazes em diferentes valências e credibilidade na relação com terceiros e na obtenção de fatores críticos de sucesso nas competições. E, na rubrica das receitas, o papel central cabe sempre, ainda que num mercado exíguo, aos dinheiros da televisão, alavancados na paixão pelo jogo.
3. Uma Liga atenta ao que se faz lá fora e apostada em “criar valor” com a globalidade dos clubes tem que meter as mãos nesta massa, liderar os que não têm a voz dos grandes e revolucionar o aproveitamento do mercado (não só nacional) e do audiovisual em favor dos PMC. Por uma razão simples: os três grandes têm poder negocial e institucional próprio; todos os outros só o terão verdadeiramente em conjunto.
4. Mas não só. Há uma teia de medidas que deveriam constituir um verdadeiro programa de emancipação dos PMC. Algumas ideias para a Liga: (a) mobilizar por região a exploração comercial das provas, sustentando parcerias em “cluster” cujos resultados fossem repartidos pelos “pequenos e médios” da região: vejam, no Algarve, as sinergias do Portimonense e do Olhanense; (b) empenhar-se na redução de custos, associando-se com as entidades prestadoras de serviços típicos da atividade desportiva; (c) cooperar com as universidades e os institutos superiores para instituir cursos de formação de dirigentes desportivos, no direito, na gestão, no “marketing”, no agenciamento, etc., que atribuíssem as ferramentas necessárias para uma “nova geração”.
5. E, para grande parte desse programa, é preciso vencer a oligarquia dominante? É, claro! Talvez mesmo o mais difícil.
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