O Presidente lançou o tradicional aviso solene, o Governo e a Oposição parecem afundados em amuos parlamentares, em nenhum lado se vislumbra uma ideia que puxe a carroça, nem umas faíscas de ânimo sequer, por toda a parte só os ares frios do conformismo, do seguidismo e da indiferença... Será possível? E, pronto, entrámos no novo ano. À falta de país, temos futebol, diria um cínico.
É verdade, sim, que esta coisa da bola tem muito de “circo” em tempos de crise de “pão”; é verdade que, muitas vezes, acaba por funcionar como “ópio do povo”, distraindo-nos alegremente de assuntos mais graves, desviando-nos do essencial. Outras vezes, já se sabe, serve também de “bode respiratório” (para usar essa maravilhosa expressão falhada) de tudo o que vai mal nos nossos portugais fatais. E no entanto...
E, no entanto, vendo bem, quem dera que o país, o país todo, estivesse à altura dos craques cá do sítio. Nem falo só do Benfica – mas do Benfica, pois, falo com mais gosto. Na ressaca das festas de Natal e Ano Novo, cheios de sonhos na barriga, e ainda por cima numa prova secundária como a Taça da Liga, os jogadores mostraram-se todos concentrados, esforçados, apostados em, pelo menos, cumprir os mínimos. “Pelo menos”, “os mínimos”, pois é, já sei... Na última crónica, nesses tempos já longínquos dos anos zero, escrevi que temos de querer sempre os máximos, o mais alto de nós – e, como é que é, agora fico-me por estes “pelo menos”, por estes “mínimos”? Sim, caros amigos, é que, para chegar aos máximos, temos de passar por aí. Esta jornada, é essa, sugiro, a lição que o país da bola dá ao país real.
Mas encostemos o ouvido às letras e ouçamos os professores Gomes e Saviola. Nuno no seu lugar cativo, em frente à baliza, de costas para a baliza; e a bola parada no ar, à espera. O português levanta o pé e, num movimento de balé clássico (ou será tai-chi?), roda sobre si mesmo transportando a redondinha para o Javier dos golos. Em menos de metade de metade de um segundo, o argentino desmonta todo o sistema filosófico do guarda-redes do Nacional e chuta, feliz, para onde ele nunca chegará, jamais, em tempo algum.
E agora, sim, já podemos apontar de novo para os máximos.
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