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29 dezembro 2010

"Acredito no Benfica campeão mesmo quando é matematicamente impossível"


Deve ter sido uma das prendas mais repetidas junto dos benfiquistas que sabem ler. E até dos que não sabem. "A Chama Imensa", livro que reúne as crónicas de Ricardo Araújo Pereira sobre o Benfica no jornal "A Bola", é um retrato do amor (às vezes ódio) de um homem pelo seu clube. O Gato Fedorento, sócio número 17.411, fala-nos das origens do seu benfiquismo e de uma fé no seu clube de tal maneira inabalável que resiste à lógica, bom senso e matemática


Esta não é daquelas entrevistas que começam com uma descrição do local onde decorreu a conversa. Não está ilustrada por um tique recorrente do entrevistado nem consta aqui qualquer referência à posição do sol aquando do encontro - até a frase "era de noite e, no entanto, chovia", faz ainda menos sentido. Ricardo Araújo Pereira, sócio número 17.411 do Sport Lisboa e Benfica, está em casa, ao computador, na véspera da véspera de Natal, a responder a perguntas enviadas dias antes por e-mail. Enquanto escreve - "não faço ideia de quanto tempo vou demorar porque tenho as miúdas, malditas férias escolares" - a compilação de crónicas "A Chama Imensa" torna-se num dos livros mais vendidos deste Natal.

É possível que a águia Vitória não volte a voar no Estádio da Luz. Vai fazer muita falta?

Sim, fará falta. E é pena. O Benfica era o único clube que conseguia organizar um espectáculo daqueles com o seu símbolo. Os leões não voam tão bem e os dragões padecem do mesmo mal que a maior parte dos penalties que se vão assinalando a favor do Porto: não existem. Ainda assim, S. Jorge matou um. Veja como deve tratar-se de um bicho irritante, para conseguir fazer com que um homem que era santo perdesse a paciência.

Qual é a sua memória mais antiga do estádio da Luz?

Talvez um Benfica-Porto de 1981. Cheguei ao terceiro anel antigo logo a seguir ao almoço, porque os jogos eram à tarde e não havia esta mariquice dos lugares marcados, como na ópera. A certa altura, Pietra deu uma soberba sarrafada ao Frasco, que ficou a contorcer-se no chão. Um consócio que estava ao meu lado gritou, com muita humanidade: "Se ele está a sofrer, o melhor é abatê-lo!" Ganhámos 1-0, golo de João Alves. Resultado magro mas, tendo em conta que o árbitro era António Garrido, foi goleada. Nesse ano, fomos campeões e ganhámos a taça, também ao Porto, 3-1 na final. Três golos de Nené. Veloso marcou um na própria baliza logo a abrir, para lhes dar um de avanço, a ver se o jogo ficava mais equilibrado. Não resultou.

Por que razão escolheu o Benfica?

Quando eu era pequeno, o meu primo António convenceu-me de que o Benfica era o melhor clube do mundo. Sem querer tirar mérito ao meu primo António, não é difícil convencer uma pessoa disso, uma vez que é verdade. Quanto ao meu primo António, é do Benfica por causa de um barbeiro que lhe cortava o cabelo no Areeiro. Portanto, em última análise, sou do Benfica por causa do barbeiro do meu primo António. Até agora, foi o máximo que consegui apurar acerca da minha genealogia benfiquista.

No seu livro fala do Shéu e do Rui Costa, de querer ser como eles. Há algum jogador da actual equipa que lhe mereça essa empatia e admiração?

Em princípio, invejo o destino de todos os rapazes que vestem aquela camisola. Hoje, gosto especialmente do Maxi [Pereira] e do Fábio [Coentrão], uma vez que só não mordem nos adversários porque as regras não permitem; do Ruben Amorim, porque é do Benfica desde os três meses - e isso nota-se no seu futebol; do Luisão e do David Luiz, porque são a melhor dupla de centrais desde Mozer e Ricardo Gomes; do Aimar, porque descobre jogadores isolados para surpresa de toda a gente - incluindo dos próprios, que se apanham sozinhos sem saber como à frente da baliza; do Carlos Martins, porque é um digno sucessor de Carlos Manuel, a locomotiva do Barreiro; e do Roberto, porque é do tamanho de um guarda-fatos que a minha avó tinha e cada vez defende melhor. E, enfim, dos outros todos.

Costuma ver os juvenis na Benfica TV e o futsal de veteranos?

Claro. Estou de olho num puto que parece o Valderrama (acho que lhe chamam mesmo Valderrama) e gosta de fintar várias vezes o mesmo adversário antes de avançar para a baliza. No futsal de veteranos, acompanho com especial interesse a carreira de um avançado que talvez tenha dois ou três quilos a mais. Isto para falar apenas nas modalidades que citou. Mas se um velhote vestir a camisola do Benfica e começar a jogar chinquilho, sou menino para ir apoiar.

A enumeração dos maiores flops do clube é uma ocupação frequente entre benfiquistas que se querem rir deles próprios. Qual é para si a mais fracassada de todas as contratações do glorioso?

Se calhar, é mais fácil fornecer-lhe o meu onze ideal de cepos: na baliza, Bossio. Moretto, Zach Thornton e Butt esperam oportunidade no banco. Lateral direito: Dudic, embora Ricardo Rojas e Gary Charles tenham valor para ocupar o lugar. Centrais: Jorge Soares e Paulão, o coice de mula. Jorge Bermúdez, Machairidis, Simanic e outros 10 ou 20 que não me ocorrem agora também eram exasperantes. No lado esquerdo da defesa, o meu coração balança entre Steve Harkness, Alessandro Escalona e Emmanuel Pesaresi. Mas se me der 5 minutos, talvez encontre pior. Trinco: Michael Thomas, com Marco Freitas, Jamir e Paulo Almeida no banco. Daqui para a frente, seria preciso escolher 5 entre Taument, Glenn Helder, Leónidas, Manduca, Luís Carlos, Luís Gustavo, Clóvis, Uribe, Hassan, Marcelo e Pringle. Uma tarefa difícil.

O que sente ao ver isto [link para o vídeo promocional da Operação Coração, no YouTube]?

Sinto alívio por já não estarmos nessa situação e incredulidade por ter sido possível convencer as pessoas a fazer essas doações. Depois lembro-me do título da Operação Coração que tenho emoldurado na minha secretária e percebo tudo um bocadinho melhor.

E isto [o golo e as lágrimas de Rui Costa depois de marcar ao Benfica enquanto jogador da Fiorentina]?

Eu estava no estádio nesse dia e na bancada também estávamos todos a chorar. Que quer que lhe diga?, os benfiquistas são pessoas sensíveis. Hoje, este episódio continua a emocionar-me, apesar de se ter tornado comum: quando o Inter marcou ao Sporting, Luís Figo também chorou. Chorou a rir, mas chorou.

Não estão em "A Chama Imensa" as crónicas todas. Como fez a selecção?

Excluí as que tinham ainda menos interesse do que as que ficaram. Só fiz ponto de honra em manter todas as que falavam de Rui Moreira. Um homem que é proprietário de um cão que ressuscita merece a distinção. Haja respeito pela Páscoa canina.

Como é ser um dos "dois rafeiros atiçados às canelas" de Miguel Sousa Tavares?

É surpreendente, porque sempre apontei para o lombo. Miguel Sousa Tavares tem uma relação um pouco conflituosa com os factos e uma grande capacidade para ignorar evidências, como certos documentos que temos vindo a ver, ler e ouvir. Ora, como disse a avó de um adepto do Benfica chamada Sophia de Mello Breyner, "vemos, ouvimos e lemos / não podemos ignorar". Palavras sábias.

Durante o período em que foi cronista de "A Bola", qual foi o melhor alvo?

Deve ter sido o Pinto da Costa. É quase inevitável, uma vez que se mantém no cargo há décadas e é um homem multifacetado, que ora declama poesia como João Villaret, ora dá indicações de trânsito como um GPS. O facto de estar a cumprir pena de suspensão por tentativa de corrupção activa enquanto se queixa das arbitragens também é divertido.

Qual é para si a equipa mais fácil de caricaturar do nosso campeonato?

É possível que seja o Sporting. Sempre que o Benfica está no fundo, o Sporting tem a gentileza de aparecer para demonstrar que é possível descer um pouco mais. Um dia depois de termos levado 5 do Porto, o Sporting jogou contra o Guimarães. Estava a ganhar 2-0. Nisto, o Vitória reduz. Depois, empata. A seguir, marca o golo da vitória. Até me passou um bocadinho da azia.

Acha que ainda vamos lá este ano?

Claro. Mas eu sou suspeito, uma vez que continuo a acreditar mesmo quando já é matematicamente impossível.

10 novembro 2010

Última Crónica do RAP ao "Jornal A Bola"


6 de Novembro de 2010

Parabéns ao Porto pela vitória de amanhã


Manda o desportivismo felicitar o adversário quando ganha, e eu aproveito para me antecipar. No jogo de amanhã, tudo está a favor do Porto. O Benfica vai, provavelmente, apresentar a sua segunda equipa. Creio que a inteligente estratégia inaugurada pelo Leiria pode ter feito escola, e não me surpreenderia que todos os clubes passassem a jogar no Dragão com as reservas. Dizem que poupar jogadores no Dragão é duplamente saudável: refresca os titulares, que descansam, e também revigora os clubes. Quando se sabe gerir o esforço é outra coisa.
Além disso, o árbitro será Pedro Proença, que é benfiquista (como Vale e Azevedo), e é o célebre inventor do penalty inexistente de Yebda sobre Lisandro López, há dois anos. Talvez Proença e Villas Boas possam, no fim do jogo, trocar algumas impressões acerca da actividade de detectar penalties que mais ninguém vê, da qual são ambos orgulhosos praticantes. De acordo com o jornal Semanário Privado de 26 de Agosto de 2009 (que só li para não ser excluído da discussão pública), Pedro Proença é também referido na escuta de uma conversa entre Pinto da Costa e Pinto de Sousa. Pinto da Costa pergunta ao amigo quem vai ser o árbitro de determinado jogo do Porto, e Pinto de Sousa responde, referindo-se a Pedro Proença: «É o que a gente combinou». O futebol pode ter muitos defeitos, mas do ponto de vista da organização é irrepreensível: quase tudo está combinado.
Mais: o Benfica tornou a preparar-se de forma deficiente para o jogo. Como se viu em Coimbra, bola na mão na área do Porto é bola na mão; bola na mão na área do adversário é penalty, o que constitui uma vantagem inestimável para os portistas. A única maneira de contrariar esta vantagem do Porto é reforçar o plantel com jogadores manetas, e o Benfica teima em não o fazer. Por outro lado, a equipa volta a apresentar-se no Dragão apenas com onze jogadores, e não com onze jogadores e onze caddies. É indigno que tenham de ser os próprios futebolistas a apanhar as bolas de golfe.

ACADÉMICA e Porto encontraram-se na semana passada para jogar uma modalidade desconhecida, e o resultado final foi a vitória do porto. Surpreendentemente, os três pontos obtidos contaram para o campeonato de futebol.
Foram várias as pessoas que disseram que o jogo não se deveria ter realizado, mas compreende-se a decisão de não adiar. Se o jogo tivesse sido adiado, o Porto chegaria ao encontro com o Benfica com apenas quatro pontos de avanço. Se se realizasse na data prevista, poderia chegar com sete. Valia a pena arriscar.

MIGUEL SOUSA TAVARES insiste que «a Declaração de Independência dos Estados Unidos é parte integrante da Constituição americana, escrita oito anos depois». Lamento, mas é falso. A Declaração de Independência não é – repito, não é – parte integrante da Constituição americana, que por sua vez não foi – repito, não foi – escrita oito anos depois, mas mais de dez anos depois. Não é bem uma questão de opinião, é um facto que pode ser comprovado por qualquer leitor, por exemplo no sítio da biblioteca do Congresso. Os leitores interessados podem ainda consultar Os Lusíadas, o Pantagruel e o Kama Sutra e verificar a curiosa coincidência de todas essas obras terem em comum com a Constituição americana o facto de a Declaração de Independência não ser - repito, não ser – parte integrante delas. Creio que, após ter confundido a Constituição com a Declaração de Independência, MST confunde agora a Declaração dos Direitos do Cidadãos (a chamada Bill of Rights), que contém as primeiras dez emendas à Constituição. Começam a faltar documentos históricos importantes para MST confundir com a Declaração de Independência, pelo que tomo a liberdade de sugerir para confusões futuras, os seguintes: a Magna Carta, o Tratado de Tordesilhas e os Estatutos do Clube Desportivo Arrifanense. Resumindo: como tenho vindo a dizer, a frase que MST citou como sendo da Constituição é da Declaração de Independência – e atribuí-la à Constituição é, aliás, um erro comum. Mas não é grave. É sem dúvida menos grave do que a incapacidade de admitir erros.
MST gaba-se de ter sido, juntamente com Cavaco Silva, «o único de todos os convidados a recusar o convite» para ir ao Gato Fedorento Esmiúça os Sufrágios. Lamento, mas é falso. Confesso que desconheço como é que MST, sem recurso a poderes mediúnicos, julga saber quem é que foi ou não convidado por nós, mas esta nova mistificação tem um objectivo claro: sugerir que os textos de MST são de tal modo excelentes que a mais pequena crítica que lhes seja feita ó pode ser produto de uma mesquinha vingança. No entanto, ao contrário do que MST pretende, recusaram ir ao programa Cavaco Silva, Jorge Sampaio, Pinto Monteiro, Manuel Pinho, Maria José Morgado, Belmiro de Azevedo, José Mourinho, Cristiano Ronaldo, Azeredo Lopes, Maria de Lurdes Rodrigues, Alberto João Jardim, Manuel Alegre, Pacheco Pereira, José Eduardo Moniz, Manuela Moura Guedes, Medina Carreira e Miguel Sousa Tavares. Faça-se justiça: MST, não tendo sido o único a recusar, foi, sim, o único a pedir 24 horas para pensar. Todos os outros decidiram mais depressa. Quanto a nós, nem retaliamos contra quem recusa nem premiamos quem aceita. Basta lembrar que Rui Moreira aceitou participar num programa nosso e leva o mesmo tratamento. Mas, tal como MST, também eu me tenho lembrado, por estes dias, do Gato Fedorento Esmiúça os Sufrágios. Era um programa cuja estratégia humorista principal consistia em apresentar declarações de determinado político a defender uma dada posição, seguidas de outras declarações do mesmo político a defender a posição oposta. A incoerência, quando é assim flagrante, tem graça. E, como vivemos em democracia, apontar as incoerências dos mais altos (e também de alguns dos menos altos) dignitários da nação é legítimo. Fazer o mesmo com as doutas opiniões de comentadores desportivos é que parece ser intolerável.

30 outubro 2010

Depois do treinador de bancada, o árbitro de bancada: uma evolução natural


Confesso que tenho dificuldade em compreender os receios que rodeiam a hipotética greve dos árbitros na semana do Porto – Benfica. Não sei se ainda mantém em rigor a velha regra segundo a qual, na ausência do árbitro, deve ser recrutado um espectador na bancada para arbitrar a partida. Se assim fosse, o mais provável seria que o árbitro do jogo acabasse por ser um adepto do Porto. Sinceramente, creio que ninguém daria pela diferença. Seria um Porto – Benfica perfeitamente normal. Já aqui recordei a noite histórica em que o Sr. Donato Ramos, depois de ter permitido que o Vítor Baía defendesse com as mãos fora da área, anulou um autogolo do Porto por fora-de-jogo posicional de um jogador do Benfica. Hoje, lembro o saudoso árbitro Carlos Calheiros (que é também o eminente turista José Amorim), que um dia assinalou um penalty contra o Benfica por uma razão que permanece misteriosa até agora. Na primeira repetição, José Nicolau de Melo descortinou (e José Nicolau de Melo descortinava como ninguém) uma falta de Mozer. Na segunda repetição, julgo que aventou uma mão de Hélder. E, na terceira repetição, concluiu que não existia falta nenhuma das infracções anteriores nem qualquer outra, mas optou por dar o benefício da dúvida ao árbitro. Gente maldosa comentou que o benefício da dúvida tinha sido o menor dos benefícios que o árbitro tinha recebido nessa noite. Acredito mesmo que qualquer adepto do Porto faria um trabalho mais isento.

Quanto à greve, não sei se tem razão de ser, mas não percebo a forma do protesto. Quando os trabalhadores da TAP fazem greve, não comparecem na TAP, que é a morada do patrão. Quando os funcionários da EDP fazem greve, abstêm-se de comparecer na EDP, que é a morada do patrão. Quando os árbitros fazem greve, ameaçam não comparecer no estádio do Dragão? Que esquisito.

Todos estes meses depois, o túnel da Luz continua a afastar o inigualável Givanildo da convocatória da selecção brasileira. Há, perversa infra-estrutura! Perversa e sectária, que o David Luiz passa lá todas as semanas e continua a ser convocado.

“ (…) é assustador verificar a frequência com que, graças a uma redacção voluntariamente ambígua da lei, são anuladas em julgamento as escutas telefónicas.”
MIGUEL SOUSA TAVARES
Expresso, 11 de Junho de 2007

“ Durante quatro semanas a fio, o jornal «Sol» levou a cabo, tranquilamente, a divulgação de escutas telefónicas recolhidas num processo em segredo de justiça e abrangendo até alguma gente que, tanto quanto sabemos, não é suspeita de qualquer crime. (…) E todos nós, mesmo os discordantes, fomos obrigados a ler as escutas e concluir a partir dos factos e indícios nelas contidos, sob pena de sermos excluídos da discussão pública”.
MIGUEL SOUSA TAVARES
Expresso, 25 de Março de 2010

Como já aqui tive ocasião de notar, há um grande consenso social em torno do fenómeno das escutas. Até gente de clubes diferentes se encontra no essencial, o que é notável e bonito. Por exemplo, eu concordo com o Miguel Sousa Tavares quando diz que é assustador o número de escutas telefónicas, algumas bem incriminadoras, que são anuladas em tribunal. E também me sinto obrigado a tomar conhecimento dos factos e indício nelas contidos, para não ser excluído da discussão pública. O que pretende quem deseja fingir que as escutas não existem é decretar a obrigatoriedade da hipocrisia. E isso, fiquem sabendo, Miguel Sousa Tavares nunca permitiria. E eu estou com ele nesta luta. Juntos venceremos, tenho a certeza.

“ Jornalista – O best seller de Carolina assume foros de escândalo. As críticas vêm até indefectíveis portistas.
Rui Moreira – O Sr. Jorge Nuno Pinto da Costa devia ter falado com os adeptos, devia ter falado com os sócios, sobre esta matéria. E devia ter-lhes pedido desculpa
(…)
Jornalista – As críticas aos administradores da SAD não se limitam à gestão.
Rui Moreira – À volta daqueles que são os grandes líderes, aquilo que acontece é que se começa a confundir a fidelidade com o cortesão. Perante o Sr. Jorge Nuno Pinto da Costa são absolutamente acríticas, mas nas costas do Sr. Jorge Nuno Pinto da Costa são as pessoas mais críticas. E esta tendência, que é típica dos cortesãos, como nós sabemos, aquilo a que se chama jogos de corredor, é típica também de uma instituição cuja a liderança se aguenta durante muitos anos. (…) Aquele passeio da fama que o FC Porto tem, Faltam lá alguns nomes, claramente.
Jornalista – Mas quem é que é o responsável por isso?
Rui Moreira – É a política de guerrilha”.

Numa interessante reportagem da RTP, disponível aqui: http://www.youtube.com/watch?v=5yjllkmd4wg&feature=related.

Tenho acompanhado com muito interesse o Trio D’Ataque na sequência do despedimento com justa causa de Rui Moreira. Por muito que me custe admiti-lo, o comunicado emitido pela SAD do Porto estava correcto: de facto, o novo elemento (além de ter a estanha mania de permanecer no estúdio durante toda a duração do programa, honrando o contrato que o liga à RTP), emite livremente opiniões que são da sua exclusiva responsabilidade. O novo modelo do programa faz lembrar o tempo em que Rui Moreira não era sequer candidato a sócio do ano, antes de ter percebido que as suas opiniões não eram as mais correctas, quer para as suas ambições inconfessadas, quer para a sua saúde. Espero que o estádio do Dragão tenha corredores espaçosos: há mais um jogador para albergar.

P.S. - Tanto Miguel Sousa Tavares (que esta semana nos obsequiou com uma excelente redacção subordinada ao tema A Caça aos Patos) como Rui Moreira (que fornece aos leitores informações interessantíssimas, como o facto de não ter visto um jogo por estar a entreter um Sr. Que até é comendador) insistem que eu não escrevo aqui sobre o que devia. O jurista que cita a declaração de independência pensando estar a citar a constituição americana considera que eu não sei do que falo; o comentador desportivo que foi despedido por não comentar tem reparos a fazer aos meus comentários. Vivemos num mundo estranho.

23 outubro 2010

E isso me envaidece


ESTIVE ontem mais de duas horas a conversar com um adepto do Benfica. Chama-se Lobo Antunes e é, além de benfiquista, um grande escritor. Um dos maiores do mundo. Sempre que lhe dão um prémio literário, e já lhos deram quase todos, fica mais prestigiado o prémio do que ele. Tem diplomas, medalhas, vários quadros de grandes pintores que quiseram pintar-lhe o retrato. Creio, por isso, que os leitores não serão capazes de lhe censurar a vaidade se disser que, em casa dele, na parede do quarto, está, emoldurada, a sua ficha de inscrição como sócio do Sport Lisboa e Benfica. Cada um tem as suas honrarias, e a vontade de exibir as maiores apenas humana.
«É extraordinário», disse ele a olhar para a moldura, «como um clube fundado por órfãos da Casa Pia – ao contrário do Sporting, fundado por um Visconde, e do Porto, fundado por banqueiros – consegue…» E, entretanto, faltaram-lhe as palavras. «É extraordinário», limitou-se a repetir. Confesso que fiquei desapontado. Afinal, um grande escritor não fazia milagres: quando alguma coisa era do domínio do indizível, não havia vocabulário, nem talento, nem nada que lhe valesse. Mas, nesse mesmo segundo, Lobo Antunes desmentiu-me. Encontrou as palavras que lhe faltavam, e começou a recitá-las: «Domiciano Barrocal Gomes Cavém. José Pinto de Carvalho Santos Águas. Mário Esteves Coluna. Alberto da Costa Pereira. José Augusto Pinto de Almeida. Ângelo Gaspar Martins. António José Simões da Costa.» Assim mesmo, com os nomes completos e sem hesitações. Mais adiante, nessa mesma tarde, António Lobo Antunes haveria de declamar um poema de Dylan Thomas. Mas não voltou a ser tão poético como naquele momento, à frente de uma ficha amarelecida por mais de 60 anos.
Antes de nos despedirmos, ainda registámos uma coincidência. No dia 23 de Maio de 1990, eu tinha 16 anos e estava a chorar em minha casa; António Lobo Antunes tinha 47 e estava a chorar na dele. Claro, Lobo Antunes é um génio, e eu sou apenas, e só quando consigo, eu. Mas, ao menos naqueles minutos que sucederam à final da Taça dos Campeões (duas ou três horas, no meu caso), a minha sensibilidade foi igual à dele. Não é a primeira vez que o Benfica faz de mim uma pessoa melhor, mas nunca deixa de ser surpreendente.
Feito este curto mas importante parêntesis, para a semana voltarei a dedicar-me às grotescas incongruências de Rui Moreira e Miguel Sousa Tavares, que é para isso que cá estou.

16 outubro 2010

Batotas que temos como evidentes


“A Constituição americana – até hoje considerada como um dos melhores textos jurídicos jamais escritos – enumera o que os Founding Fathers chamaram de «verdades que temos como evidentes».
Miguel Sousa Tavares
A Bola, 12 de Outubro de 10

Aparentemente, há juristas que lêem a Constituição americana sem o cuidado que é devido a um dos melhores textos jurídicos jamais escritos. Na verdade, não é Constituição americana que enumera aquilo a que os Founding Fathers chamaram verdades que temos como evidentes. Essas são enumeradas na Declaração de Independência, que foi escrita uma boa década antes da Constituição. É, então, na Declaração de Independência que os chamados países fundadores dos Estados Unidos expõem as verdades que consideram evidentes: que todos os homens são criados iguais, que são dotados pelo Criador de certos direitos inalienáveis, e que entre esses direitos se contam o direito à vida, à liberdade e à busca da felicidade. Uma das verdades que não é evidente, quer para a Constituição, quer para a Declaração de Independência, é que os cidadãos tenham o direito inalienável de não serem escutados. Como é evidente, todos os cidadãos têm o direito à privacidade – mas esse direito não é absoluto. E a magnífica lei americana permite o uso das escutas como meio de investigação, assim como a lei portuguesa. Que horror! Mas não era a PIDE que também escutava? Era. Se bem me lembro, a PIDE também prendia e, apesar disso, no regime democrático há quem continue a ir preso. A diferença é simples, mas parece que é difícil de entender: a PIDE escutava e prendia arbitrária e ilegitimamente, como é próprio das polícias políticas das ditaduras; a polícia das democracias escuta e prende justificada e legitimamente, como é próprio do Estado de direito democrático. O mais intrigante, no caso das escutas do Apito Dourado, é o facto de haver discussão quando, afinal, estamos todos de acordo. Por exemplo, estou de acordo com Miguel Sousa Tavares quando, depois de José Sócrates lhe ter dito que não devíamos conhecer o conteúdo das escutas do processo Face Oculta, respondeu: ‘Mas conhecemos. Eu também acho que não devíamos conhecer, mas conhecemos. E, uma vez que as conhecemos, não podemos fingir que conhecemos. Eu, pelo menos, não posso’. (http://www.toutube.com/watch?v=R1WI8t7JY6Y&t=08m07s) E estou de acordo com Rui Moreira, quando ontem confessou aqui a razão pela qual comentou as escutas que envolviam o nome de José Sócrates: «(…) limitei-me a não ignorar o que era público, ainda que resultasse de uma ilegalidade. Ninguém se pode alhear do que é público e das suas consequências». A única diferença é que eu tenho esse opinião relativamente a todas menos as do Apito Dourado. Também acho que não devíamos conhecer a escuta em que Pinto da Costa combina com António Araújo oferecer fruta para dormir ao JP, mas conhecemos. E, uma vez que a conhecemos, não podemos fingir que não conhecemos.
Eu, pelo menos, não posso. Quando comento a escuta em que Pinto da Costa dá indicações a um árbitro para que vá a sua casa nas vésperas de um jogo, limito-me a não ignorar o que é público, ainda que resulte de uma ilegalidade. Até porque ninguém se pode alhear do que é público e das suas consequências. Além disso, note-se, até concordo com MST quando diz que as escutas vieram a público nesta altura por causa do Porto – Benfica. O objectivo é prejudicar o Benfica: os jogadores que tiverem conhecimento das escutas ficam a saber que, por mais que se esforcem, se o árbitro estiver trabalhado não têm hipóteses de ganhar. Desmoraliza qualquer um.
Rui Moreira desfez-se em explicações para justificar que comentar umas escutas é um acto legítimo e comentar outras é uma vileza sem nome. Agora que foi despedido, talvez Rui Moreira tenha mais tempo livre para entrar num negócio que gostaria de lhe propor: formarmos um circo. Como ele já aqui tem sugerido várias vezes, eu seria, evidentemente, o palhaço. Ele seria o contorcionista. Não são muitos os artistas que se podem gabar de ter um número tão bom como o dele. A única maneira de Rui Moreira e MST comentarem uma escuta de Pinto da Costa é o presidente do Porto ser apanhado numa conversa telefónica com José Sócrates. Mesmo assim, suponho que fizessem um comentário misto, debruçando-se apenas sobre intervenção de Sócrates reforça a nossa desconfiança nele. Agora temos uma parte do telefonema que não devíamos conhecer e temos nojo de quem a comenta. Agora está Sócrates novamente a fragilizar a sua credibilidade. E agora temos mais uma parte da conversa que é indigno estarmos a ouvir’.
Umas coisas são picardias maliciosas, típicas do mundo do futebol; outra, bem diferente, são ofensas. E Villas Boas ofendeu-me gravemente numa conferência de imprensa que deu esta semana. Disse que as minhas crónicas eram as únicas que gostava de ler porque eu o fazia rir. Sinceramente, creio que não merecia o insulto. Todas as semanas faço aqui o melhor que posso para provocar Villas Boas. Já recorri a tudo: sarcasmo, ironia, escárnio, simples sacanice, E Villas Boas tem a repugnante nobreza de carácter, o asqueroso desportivismo de achar graça. Para ele, se bem percebo, isto do futebol é a coisa mais importante do mundo para todos, mas no fim acaba por ser um jogo de que nos podemos rir juntos, seja qual for o nosso clube. Simplesmente infame. Exijo que passe a ter o fair-play de um Rui Moreira, que gosta muito de piadas desde que não sejam sobre ele. Obrigado.

15 outubro 2010

in Governo Sombra


09 outubro 2010

António Araújo e judeus do século XVII: vítimas diferentes, a mesma ignomínia



“Obviamente, o João pode ser o João não podia ter sido nomeado para este jogo"
RUI MOREIRA
A Bola, 13 de Agosto de 2010

Embora quase ninguém tenha dado por isso, há cerca de dois meses foi cometido um crime nestas mesmas páginas. Não é segredo para ninguém que a divulgação do conteúdo das escutas é proibida. Ora, quando usou a expressão o João pode ser o João, Rui Moreira estava, como se sabe, a citar propositadamente uma escuta em que intervém o presidente do Benfica, publicitando o seu conteúdo. Trata-se de um comportamento completamente inaceitável e extremamente pidesco. E vice-versa. Pela minha parte, devo dizer que não participo em autos de fé, e não poso continuar a colaborar passivamente num jornal que se transforma num auto de fé. Não tenho, por isso, outra alternativa senão abandonar esta crónica durante dois parágrafos.

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Creio que a minha posição ficou clara, e espero que esta atitude simbólica contribua para moralizar o debate futebolístico e o próprio mundo em geral. Lamento ter chegado a este ponto, mas o caso é mais grave do que parece: Rui Moreira é reincidente neste tipo de conduta vergonhosa. No dia 26 de Fevereiro de 2010, o jornal i colocou a várias personalidades a seguinte pergunta: Depois dos episódios recentes relacionados com as escutas e o caso Face Oculta, mantém a confiança no primeiro-ministro? A resposta de Rui Moreira foi: «O primeiro-ministro tem que ser um factor de confiança perante o exterior e agora acho que passou a ser um factor de desconfiança perante o exterior». Sei que o leitor está tão chocado como eu. Rui Moreira não faz qualquer comparação entre a Santa Inquisição e as escutas (que todos os historiadores acham parecidíssimas), não condena os bandidos que as publicaram, nem se demarca da porcaria, da canalhice e da insídia. Não só conhece as escutas como as comenta, tendo mesmo o descaramento de tirar conclusões com base no seu conteúdo. Repugnante. Quando é que esta gente compreende que, nisto da escutas, tudo é indigno (menos o que lá é dito)?

Entretanto, parece que houve problemas no Trio d’Ataque, da RTPN. Não costumo assistir mas, ao que me disseram, um dos representantes do Porto no programa abandonou o estúdio – o que acabou por beneficiar o clube. Segundo ouvi dizer, a cadeira vazia revê, no resto do debate, uma postura mais sensata e digna do que o seu ocupante habitual costuma ter. Até nisto têm sorte, os portistas. Evidentemente satisfeitos com a nova representação, os responsáveis da SAD do Porto emitiram um comunicado no qual afirmam que o clube «não apoiará qualquer sócio ou adepto que venha a ser enquadrado como representante do clube, nem lhe prestará qualquer tipo de informação, pelo que todas as suas posições serão sempre pessoais». Na tentativa de manter a excelente cadeira como representante, o Porto decreta um blackout preventivo a um possível futuro comentador. Percebo a intenção, mas gostava que a RTPN arranjasse um substituto. Sem desprimor para os porta-vozes oficiais, seria refrescante ver um comentador do Porto cujas posições fossem, desta vez, sempre pessoais.

Os adeptos de futebol assistiram, na semana que passou, a um fenómeno meteorológico interessante. Todos conhecíamos o fogo-de-santelmo, uma luz provocada por descargas eléctricas na atmosfera, observada frequentemente pelos marinheiros. Parece mesmo fogo, mas não é. «Vi claramente visto o lume vivo», diz Camões n’Os Lusíadas. Esta semana, Portugal conheceu o penalty de Santelmo. Vi claramente visto o penalty nítido, teria dito o poeta, se tivesse escrito a epopeia do futebol português (e em hendecassílabos). De facto na segunda-feira, o penalty era claríssimo. «São muitos dos meus jogadores a dizerem que é demasiado claro», declarou Villas Boas. Apelou a que toda a gente metesse pressão na TVI para mostrar as imagens que, por capricho ou conspiração, se recusava a transmitir. «77:53!», bradava o director de comunicação, sem que se percebesse ao certo se estava a indicar um minuto do jogo ou um versículo da Bíblia que anunciava que o fim estava próximo para todos os que não vissem o penalty.
As imagens, por manifesta má vontade, é que teimavam em não mostrar nada. Passou um dia. Deve ter havido reuniões. Que fazer? Atacar a credibilidade das imagens? Se as escutas não podem ser aceites como meio de prova, era o que faltava que as imagens pudessem sê-lo. Não, está muto visto. Não havia alternativa: era mesmo preciso fazer um mea culpa. Afinal, 24 horas depois, as buscas terminaram e o penalty não apareceu. O que era claríssimo passou a inexistente. Pois bem, devo dizer que não concordo. Na minha opinião, André Villas Boas tinha razão na segunda-feira à noite. O lance que ocorre aos 77 minutos e 53 segundos do Guimarães – Porto é mesmo penalty. Trata-se de uma jogada em que nenhum jogador adversário comete qualquer infracção às leis do jogo. Normalmente, é o que basta para ser penalty a favor do Porto. Há jurisprudência neste sentido. As regras do futebol são uma coisa, a tradição é outra. Um jogo em que o árbitro se limita a perdoar um penalty ao Porto e a protelar a expulsão do Fucile durante vários minutos continua a ser um escândalo, e não há imagens que me convençam do contrário.

No final do jogo, nem todas as declarações foram absurdas. «Vou ficar atento para saber se este árbitro vai de férias», avisou Pinto da Costa. Ora até que enfim. Não foi precisamente por falta de atenção às férias dos árbitros que certas facturas da Cosmos que foram pagas por engano? Pode ser que alguma coisa esteja a mudar.

02 outubro 2010

O Totobola da opinião


“A Bola tem três cronistas portistas – o Francisco José Viegas, o Rui Moreira e eu próprio. E, fora os da casa, tem três benfiquistas: o RAP, o Sílvio Cervan e a Leonor Pinhão. Nós, os três portistas, todos aqui escrevemos que (apesar do túnel da verdade, de quase metade dos jogos terminados com superioridade numérica e tudo o resto), o campeonato do ano passado ganho pelo Benfica foi inteiramente justo, porque jogou o melhor futebol. (…) Mas alguém já viu algum dos cronistas benfiquistas reconhecer mérito (…) a uma vitória do FC Porto (…)?
Miguel Sousa Tavares
28 de Setembro de 2010

“Durante muito tempo, achei (…) que, com túnel ou sem túnel, o Benfica merecia ganhar este campeonato, porque era a equipa que melhor jogava (…). Mas a verdade é que um campeonato não são 15, nem 20, nem 25 jornadas: são 30 e o saldo final deve-se fazer às 30. E, no último terço do campeonato, desapareceu aquele Benfica que jogava mais e melhor
Miguel Sousa Tavares
11 de Maio de 2010

“O Fernando Guerra pode, pois, tomar nota desde já: dificilmente os portistas e os bracarenses irão reconhecer o mérito de um campeonato ganho pelo Benfica nestas circunstâncias
Miguel Sousa Tavares
16 de Fevereiro de 2010

NÃO tenho outro remédio senão admitir que Miguel Sousa Tavares tem sempre razão. Ter sempre razão não é fácil, e MST consegue-o da maneira mais trabalhosa. MST não tem sempre razão por conseguir exprimir constantemente a opinião mais correcta, mas sim por exprimir uma grande variedade de opiniões sobre o mesmo assunto. Nisto das convicções, MST joga com múltiplas. Acerca do último campeonato, às segundas, quartas e sextas reconhece o mérito do Benfica; às terças, quintas e sábados assegura que o Benfica não teve mérito nenhum. Aos domingos, provavelmente, descansa a espinha dorsal, que deve chegar dorida ao fim-de-semana. No entanto, mais notável do que a capacidade para estar sempre certo é o talento para manter a mesma superioridade moral quando diz uma coisa e o seu rigoroso inverso. É muito raro uma trampolinice ser eticamente irrepreensível, mas para MST não há impossíveis. Nos dias em que garante que os portistas são os únicos que reconhecem o mérito dos adversários, MST tem a superioridade moral dos que aceitam a derrota com desportivismo; nos dias em que exige que fique registado que os portistas nunca reconhecerão o mérito dos adversários, tem a superioridade moral dos que não pactuam com fraudes.

Quanto a mim, é evidente que não possuo arcaboiço para competir neste campeonato de moralidade com MST – quer com o que tem a nobreza de reconhecer méritos, quer com o que tem a dignidade de não reconhecer méritos nenhuns. Só posso prometer que, se o presidente do Benfica for apanhado em escutas a indicar o caminho para sua casa a um árbitro nas vésperas de um jogo, a Leonor Pinhão, o Sílvio Cervan e eu viremos aqui escrever que esse tipo de conduta nos envergonha. E daremos razão a todos os adversários que não reconhecerem mérito a títulos conquistados à custa desse modelo de dirigismo desportivo. É pouco, mas é o que tenho para oferecer.

“Realmente, Luís Filipe Vieira e Ricardo Araújo Pereira têm razão: O Hulk é uma banalidade. Deve ser por isso que tão empenhadamente manobraram para o tirar de jogo
Miguel Sousa Tavares
28 de Setembro de 2010

COMO se não fizesse já demasiado, MST ainda tem a simpatia de ser meu arquivista. E dos mais competentes: tanto colecciona o que vou dizendo, como também arquiva o que nunca disse. Na verdade, eu nunca disse que o Givanildo era banal. Posso ter tido o atrevimento de pensar, como o seleccionador do Brasil, que não é igualável. Talvez tenha a insolência de acreditar – como, aparentemente, a generalidade do mercado -, que não vale 100 milhões de euros. Mas, no que diz respeito a críticas, nunca fui tão violento como o vigilante Rui Moreira, que ainda há um ano escrevia: «Hulk (…) não sabe jogar de costas para a área (…). Além disso, parece ter entendido mal os recados do treinador e o mais que dele se viu foi que se entreteve a adornar as jogadas, a tentar ‘quaresmices’ e a simular faltas.» Nunca fui tão acintoso como o mesmo Rui Moreira, que dois meses depois acrescentou: «Gostei de ver Hulk sentado no banco. (…) talvez lhe devessem ter explicado que fora preterido por causa dos seus tiques e individualismo, das suas inócuas simulações. Talvez assim tivesse optado por uma outra atitude, logo que surgisse a oportunidade de jogar. Em vez disso, e como tem sido costume, Hulk foi de pequena utilidade quando entrou.» E nunca disse que, na época passada, as prestações do Givanildo estavam «a léguas do desempenho do ano anterior», como escreveu aqui MST escassos 40 dias antes de o jogador, talvez por causa do fraco desempenho futebolístico ter resolvido dedicar-se ao pugilismo.

Por outro lado, sou dolorosamente forçado a reconhecer que MST me desmascarou quando revela que, em concluio com o presidente do Benfica, eu «manobrei empenhadamente para tirar o Givanildo de jogo». Normalmente, as teorias da conspiração consistem em palermices mais ou menos lunáticas, sem qualquer sustentação em provas. Não é o caso desta. A pujança da minha influência no futebol português é bem conhecida. As conversas conspiratórias que mantenho com Luís Filipe Vieira estão amplamente documentadas no YouTube. MST e Rui Moreira ainda tentaram enganar-me, escrevendo várias vezes que o rendimento do Givanildo era pobre, para que eu fosse levado a pensar que o jogador não era assim tão fundamental na manobra da equipa do Porto, na época transacta. Mas a mim ninguém passa a perna, e fui precisamente o Givanildo que eu escolhi para tirar de jogo através das minhas maquinações. Confesso: o castigo do Givanildo foi ideia minha.

Por absoluta falta de espaço, deixo para a semana a confissão do meu envolvimento na morte do Kennedy.

25 setembro 2010

A mão (de Rolando) que segura o andor



A dureza com que a equipa do Sporting foi criticada após a derrota na Luz deixa-me na posição ingrata de ter de a defender. Concedo que a exibição não foi boa, o que acaba por ser normal. Como já aqui escrevi, parece-me que o Sporting não está tão forte como no ano passado. No entanto, os riscos de desflorestação não se confirmam. É verdade que saiu uma maça e o pinheiro acabou por não vir, mas o modo como Aimar e Saviola se mexeram entre o meio campo e a defesa do Sporting deu a entender que os jogadores leoninos estavam bem plantados na relva. No fim do jogo, pareceu-me ver o preparador físico do Sporting a desenraizar o Maniche da entrada da área. E um dos adjuntos teve de enxotar a águia Vitória, que se preparava para começar a fazer o ninho no ombro do Nuno André Coelho.




DESEJO aderir ao novo modelo de crónica futebolística em que o autor revela, para mais que previsível gáudio dos leitores, onde, como e quando, viu determinado jogo, e ainda tem a gentileza de fazer a resenha das opiniões emitidas por comentadores estrangeiros – que são sempre os mais perspicazes e informados sobre o futebol português.
Antigamente, o público não sabia se um cronista tinha assistido a determinado desafio em directo ou se tinha sido obrigado a ver uma gravação, se tinha visto a partida em território nacional ou estrangeiro. Esses tempos, felizmente, acabaram. Informo então que assisti ao Nacional – Porto no Brasil, através de um canal televisivo local. Estava uma temperatura agradável. Ingeri 72 tremoços durante a transmissão. Os comentadores consideram claríssimo o penalty não assinalado após evidente mão de Rolando na área (que bobagem!, exclamaram os comentadores) e perceberam, sem recurso à repetição, que tinha sido mal tirado o fora-de-jogo ao ataque do Nacional. Um dos comentadores, especialmente bem preparado, lembrou a propósito a célebre conferência de imprensa em que Alex Ferguson afirmou que o Porto comprava os seus títulos no supermercado. De facto, o futebol português, visto no estrangeiro, tem outro interesse.

MAIS um escândalo que resulta de inomináveis injustiças: o seleccionador do Brasil, evidentemente seguindo instruções do dr. Ricardo Costa, chamou David Luiz e deixou de fora da convocatória o inigualável Givanildo. Creio que se impõe uma vigília.

ACOMPANHEI, com alguma surpresa, as reacções da imprensa nacional à derrota do Braga frente ao Arsenal. Pareceram-me exageradas. É verdade que o Braga levou 6, mas a equipa portuguesa que lá foi no ano passado levou 5. É possível que, em Londres, ninguém tenha dado pela diferença. O único pormenor que verdadeiramente distinguiu as duas derrotas talvez tenha sido este: desta vez, o presidente da equipa goleada apareceu no aeroporto juntamente com a equipa, à chegada a Portugal.

O comunicado da direcção do Benfica continua a suscitar os mais variados comentários. Uns apoiam-no, outros reprovam-no, e até o treinador André Villas Boas fez uma observação da qual não retive mais do que o facto de incluir a palavra quaisqueres. Uma das críticas mais frequentes, e à qual sou particularmente sensível, tem a ver com a circunstância de o comunicado disparar em direcções tão díspares como a arbitragem e a comunicação social. Também me parece descabido. Ainda se tivessem sido publicadas escutas em que se ouvisse o presidente de um clube a dar indicações a um árbitro sobre o melhor caminho a tomar em direcção a sua casa, talvez se percebessem melhor as referências à arbitragem. Bem assim, se fosse pública outra escuta em que se ouvisse o presidente do mesmo clube a dar indicações a um jornalista sobre o que devia escrever, talvez se compreendesse a desconfiança relativamente à comunicação social - e talvez se percebesse que o tema é, afinal, mais ou menos o mesmo. Uma vez que nada disso sucedeu, o comunicado parece bater-se contra moinhos de vento que mais ninguém vê (nem ouve).

18 setembro 2010

Um protesto sem vigílias não é um protesto


O comunicado emitido pela direcção do Benfica teve, até ver, pelo menos um grande mérito: causou igual desagrado a portistas e sportinguistas (passe o pleonasmo). Os portistas até apreciam comunicados, mas só se forem lidos pelo terceiro guarda-redes. Gostam de queixas sobre a arbitragem, mas só se forem feitas ainda na pré-época, como fez Villas Boas no torneio de Paris. E levam a mal que uma iniciativa destas não inclua uma comovente vigília previamente anunciada na TV. Organizar romarias à sede da Liga para repudiar o castigo aplicado a um inocente que se limitou a participar num espancamento
é pugnar pela justiça e pela verdade; lamentar a existência de vários erros graves de arbitragem é uma palermice folclórica.
Quanto aos sportinguistas, preferem tomadas de posição mais funéreas como um luto, por exemplo. Comunicados são, para eles, queixinhas.
Queixinhas essas que podem eventualmente vir a prejudicá-los, pelo que, após aturada reflexão, decidiram fazer queixinhas das queixinhas do Benfica, inaugurando assim as queixinhas por antecipação. Queixinhas preventivas e dignas, que antecipam factos hipotéticos, e que contrastam flagrantemente com as queixinhas condenáveis, que são as que se referem a factos consumados e comprovados. Donde se conclui que o Benfica foi prejudicado em Guimarães para seu próprio benefício, e para grave prejuízo do Sporting. Só não vê quem não quer.
A homenagem da Associação de Futebol do Porto a Olegário Benquerença gerou uma comoção que não pode deixar de se considerar admirável. Fico sempre impressionado com as pessoas que ainda conseguem surpreender-se com o futebol português. Se é absolutamente normal que um árbitro visite a casa do presidente do Porto («Sempre em frente!») nas vésperas de arbitrar um jogo do mesmo clube, porque haveria de ser menos normal que um árbitro de Leiria fosse homenageado pela Associação de Futebol do Porto nas vésperas de dirigir um jogo do Benfica e mais de dois meses depois das extraordinárias façanhas merecedoras da homenagem? Ambas as situações foram explicadas tão convincentemente que só poderiam deixar dúvidas em espíritos menos puros.
O árbitro Augusto Duarte buscava aconselhamento matrimonial para o papá, e foi por isso que quis escutar a opinião ponderada de um homem cujo talento para manter matrimónios estáveis e discretos é publicamente conhecido e aclamado.
A Associação de Futebol do Porto quis homenagear Olegário Benquerença, natural de Leiria, porque os seus auxiliares são portuenses. No fundo, o procedimento habitual nestes casos.
Quem não se lembra da linda homenagem que a Associação de Futebol de Beja prestou a Carlos Valente, que esteve no Mundial de 1990 com um assistente que tinha uma vizinha que era alentejana? Ou a festa de arromba que a Associação de Futebol da Guarda organizou em honra de Vítor Pereira, presente no mundial de 1998, e que na altura era dono de um cão de raça Serra da Estrela, o que muito orgulhou os organismos do futebol da região?

Jorge Costa prossegue a sua magnífica recuperação da Académica, que se encontra neste momento em terceiro lugar, bem longe do triste 11º posto em que terminou no ano passado. Com um plantel praticamente idêntico ao da época anterior, o novo treinador dos estudantes - que, recorde-se, nunca redigiu relatórios para Mourinho -, insiste em fazer melhor que o seu antecessor. Uma impertinência que lhe pode sair cara.

11 setembro 2010

O Futebol Português rejuvenesce



Há duas semanas, escrevi aqui que a época 2010/2011 começava naquele dia, quando o Benfica jogasse com o Vitória de Setúbal. O jogo acabou com a vitória do Benfica por 3-0, e eu convenci-me de que tinha razão. Afinal, devo confessar que me enganei. Não estamos a assistir ao início da época 2010/2011. O campeonato que agora começa é o respeitante à época 1996/1997. Aquele ano em que se juntaram, na primeira divisão, árbitros como José Pratas, Augusto Duarte, Soares Dias e Isidoro Rodrigues, entre tantos outros. A arbitragem de ontem, em Guimarães, foi de 96/97. Até quem viu o jogo em casa sentiu o cheiro a naftalina. E os apreciadores de antiguidades terão admirado o rigor com que Olegário Benquerença aplicou as regras daquela altura.
Foi um espectáculo comovente. Quando um jogador vimaranense tentou separar a perna do Aimar do resto do corpo com um pontapé, dentro da área do Vitória. Senti-me 14 anos mais novo. A falta não assinalada que Carlos Martins sofreu, também dentro da área, fez me recuar à juventude. O fora de jogo inexistente que impediu Saviola de ficar isolado à frente de Nilson trouxe me à memória o viço dos meus vinte anos. E, quando Cardozo viu um cartão amarelo por ter marcado um golo limpo, quase chorei de nostalgia. Sou um sentimental, e estes regressos ao passado comovem-me. Só não percebo a razão pela qual este Vitória de Guimarães Benfica foi transmitido pela SportTV, em lugar de ter passado na RTP Memória. Quanto a Olegário Benquerença, já conhecíamos o seu talento como imitador de Quim Barreiros (quem não conhecer, veja o vídeo no YouTube). Mas não sabíamos que ele também tinha jeito para imitar o Martins dos Santos.
Que se saiba, ninguém seguiu o conselho de higiene institucional que Carlos Queiroz nos deixou, gratuitamente, em meados da década de 90: não há notícia de alguém ter varrido a porcaria da Federação. Não serei eu a pôr em causa a necessidade de varrer porcaria, seja na Federação ou noutro sítio, mas, não tendo a porcaria sido varrida, foi com porcaria que Humberto Coelho chegou às meias-finais de um Europeu, e foi na companhia da mesma porcaria que Scolari conseguiu ser vice-campeão da Europa e quarto classificado num Campeonato do Mundo. Bem sei, bem sei: o mérito dos feitos de Humberto Coelho e Scolari é todo de Carlos Queiroz. Foi ele quem lançou as bases. Construiu a estrutura. Pensou o edifício das selecções. E a responsabilidade pelo actual momento da Selecção é de todos menos de Queiroz. Por azar, ele tomou conta da Selecção precisamente na altura em que o efeito da sua obra começou a desvanecer-se. Os seus predecessores destruíram as bases, ignoraram a estrutura e borrifaram se no edifício. Curiosamente, Carlos Queiroz tem mais mérito e influência nos resultados da Selecção quando não está a treiná-la do que quando é seleccionador nacional. E, mesmo quando está longe, Queiroz consegue ser autor moral apenas dos êxitos: é ele o responsável pelo sucesso da equipa que fez um brilharete no Euro 2000, mas não tem responsabilidade nenhuma no desastre do Mundial de 2002, sendo que a chegada à final do Euro 2004 volta a ter o seu dedo.
O despedimento de Queiroz deve agradar, por isso, a ambas as partes: à Federação — que, com processos disciplinares consecutivos, fez tudo para o despedir sem nunca dizer que queria despedi-lo; e ao seleccionador — que, insultando os médicos na Covilhã e o vice-presidente da Federação no Expresso, fez tudo para ser demitido sem nunca dizer que queria demitir-se. Por um lado, é uma pena que Queiroz e a Federação se separem. Fazem um lindo par.
No fim, a cabeça do polvo, pelos vistos, conseguiu o que queria — o que significa que este é o segundo octópode a ser bem sucedido no mundo do futebol em meia dúzia de meses. Infelizmente, dizem-me que ficávamos mais bem servidos se o polvo alemão que adivinhava resultados viesse ocupar o cargo de vice-presidente da Federação e Amândio de Carvalho fosse para dentro daquele aquário na Alemanha.

06 setembro 2010

Jorge Sousa, um árbitro do Porto...

Reza a lenda que o árbitro Jorge Sousa foi membro dos Super-Dragões. Não sei se o boato começou porque alguém testemunhou a sua presença na claque ou porque, nos jogos que arbitra, Jorge Sousa parece mais portista que o Jorge Nuno.

No Braga-Benfica do ano passado, ficou célebre o golo anulado ao Benfica porque, ao que supuseram os especialistas na altura, Luisão teria respirado com demasiada força no momento de cabecear.

Na final da Taça da Liga, permitiu que Bruno Alves e Raul Meireles ficassem em campo até ao fim, provavelmente para ver qual dos dois venceria o seu campeonato privado de agressões. Foi renhido, mas julgo que ganhou Bruno Alves por 4-3.
No Rio Ave-Porto desta semana, deixou que Falcão se pusesse às cavalitas de um adversário no primeiro golo e admoestou, com cartão amarelo, um jogador vila-condense por ter tido a desfaçatez de sofrer um penalty.

Quando se diz que determinado jogo vai ser arbitrado por Jorge Sousa, árbitro do Porto, sou eu o único que suspeita que não se estão a referir à origem geográfica do juiz?
A interessante entrevista que Jesualdo Ferreira deu esta semana parece explicar o motivo pelo qual Pinto da Costa só costuma prometer títulos a treinadores já falecidos: é da natureza dos defuntos não concederem entrevistas. Três meses depois do fim do campeonato brilhantemente conquistado pelo Benfica, o treinador da equipa que terminou atrás do Braga — e que é, aliás, o homem a quem mais conviria arranjar uma desculpa para a posição em que ficou classificado —, veio admitir que o Porto ficou em terceiro porque «houve duas equipas, nomeadamente a que foi campeã, que foi mais competente». Para surpresa de todos, não fez referências a túneis nem a burocratas. Que estranho. Jesualdo Ferreira deve ter estado distraído. Todos vimos, por exemplo, como o Benfica bateu o Porto no Algarve, na final da Taça da Liga.

No primeiro golo, o túnel de Braga recuperou uma bola no meio campo, fez uma tabelinha com o túnel da Luz e passou ao dr. Ricardo Costa, que rematou de fora da área, batendo Nuno. No segundo golo, o dr. Ricardo Costa apontou superiormente um livre directo fazendo a bola entrar no ângulo superior direito da baliza. E no terceiro, o dr. Ricardo Costa completou o seu hattrick após jogada de insistência do túnel de Braga pela direita. Foi a época toda nisto, e agora Jesualdo Ferreira vem atirar-nos areia para os olhos dizendo que o Benfica venceu porque foi melhor. Ele há cada uma!

O jogo que a selecção fez ontem teve, pelo menos, a virtude de revelar quem tem razão no caso Carlos Queiroz. Este Portugal-Chipre demonstrou cabalmente que a Autoridade Anti-Dopagem não tinha qualquer motivo válido para invadir o estágio dos jogadores portugueses. Passa pela cabeça de alguém que uma equipa que não consegue bater o Chipre em casa esteja a tomar substâncias proibidas? Parece-me um caso evidente de excesso de zelo.

Quanto à selecção de sub-21, apesar da derrota frente à Inglaterra acredito que esteja no bom caminho. O ponta-de-lança Bebé, por quem o Manchester United deu cerca de 10 milhões de euros, parece-me ser um jogador de futuro. Trata-se, aliás, do segundo bebé mais caro do futebol português, a seguir ao de Cristiano Ronaldo, o que indica a qualidade do atleta.

31 agosto 2010

Agora sem mãos - Por Ricardo Araújo Pereira

Por Ricardo Araújo Pereira in A Bola

É a questão que os benfiquistas mais descrentes colocam a si próprios por estes dias: o Benfica já perdeu o campeonato em Agosto ou os quatro pontos de atraso para o Braga ainda são recuperáveis? É uma inquietação legítima, mas temo que o verdadeiro alcance deste início de época não esteja a ser compreendido por todos.

O problema é este: um campeonato até Jaime Pacheco ganha. Mas ganhar um campeonato à Benfica, às vezes nem o Benfica consegue. O último campeonato foi ganho à Benfica. Com grandes exibições, goleadas, enfrentando o melhor Braga de sempre e um Porto orientado por um treinador tricampeão. Este ano parece-me que faltava alguma motivação. O Braga, desfalcado e empenhado nas competições europeias, aparenta estar menos capaz de suportar uma prova tão longa, e o Porto passou a ser treinado pelo Mourinho de pechisbeque. Era óbvio que o Benfica precisava de um desafio. Daquela emoção que o artista do poço da morte procura quando grita: «Agora mais difícil: sem mãos!» Que se passou, desde há três meses? Jesus é o mesmo. Os jogadores também, quase todos. O que equivale a dizer que o poço é o mesmo e a mota também. Um aborrecimento. As cabriolas do ano passado já não nos impressionariam. Era altura de gritar: «Agora mais difícil: sem vitórias até 28 de Agosto!» O campeonato começa hoje, meus amigos.

“ (…) se, como eu prevejo, o Braga, ficando em segundo lugar, não sobrevive às eliminatórias da Champions, isso significa que o Benfica faz sua toda a receita dos direitos televisivos, sem ter de a dividir a meias com outro clube português participante na competição. Há que estar atento, Sr. Vítor Pereira”
Miguel Sousa Tavares, 6 de Abril de 2010

Quando se percebe de futebol é outra coisa. Há quatro meses, o Braga estava a ser beneficiado pela arbitragem – o que, surpreendentemente, favorecia o Benfica. O mesmo Braga que só perdeu o campeonato na última jornada, o mesmo Braga que amealhou pontos suficientes para ser campeão em vários dos últimos campeonatos, estava a ser beneficiado para ajudar o clube cujos calcanhares andou a morder até ao fim. O raciocínio, chamemos-lhe assim, era simples: como, depois de apurado para a Champions, o Braga não passaria à fase de grupos, o Benfica receberia a totalidade dos direitos televisivos, perante a passividade do desatento Sr. Vítor Pereira. Talvez fosse útil a publicação de um manual de instruções para teorias de conspiração. O primeiro mandamento estipularia: se a teoria não tiver pés nem cabeça e se basear apenas numa previsão com a pujança premonitória das do professor Bambo, abandone-a. Aí está uma obra que evitaria alguns embaraços, uma vez que a realidade se encarregou de demonstrar que, tal como pensavam todos os que não estavam de má-fé, este Braga ficou em segundo lugar porque era mesmo superior ao plantel mais caro de sempre do futebol português. Que o Sporting de Braga seja, então, bem-vindo à Liga dos Campeões, até porque não é todos os dias que se consegue ver um Sporting nesta competição.

22 agosto 2010

Uma Semana humilhante - Por Ricardo Araújo Pereira


Por
Ricardo Araújo Pereira in A Bola

A derrota do Benfica em casa, frente à Académica, não pode deixar de ser considerada humilhante. Humilhante para o Porto, bem entendido: em tão pouco tempo e com um plantel muito semelhante, Jorge Costa já está a fazer melhor do que André Villas-Boas. Quem assistiu, no ano passado, à derrota da Académica de Villas-Boas no Estádio da Luz por 4-0 constata sem dificuldades que a Académica de Jorge Costa está muito mais bem orientada.

Como se a vergonha do fim-de-semana não bastasse, o Porto viria a ser reincidente na desonra dias depois, perdendo Salvio para o Benfica. Ciente da dimensão do enxovalho, André Villas-Boas tentou fingir que o que toda a gente sabia era mentira numa conferência de imprensa em que, por incrível que pareça, não usou uma vez que fosse a palavra «exacerbação». Disse o treinador do Porto que, se o seu clube estivesse interessado em Salvio, o jogador estaria no plantel - uma vez que os portistas se antecipam ao Benfica nas contratações sempre que o desejam. Sem querer exacerbar, todos sabemos que tal não é verdade. Se o Porto conseguisse roubar ao Benfica todos os profissionais que interessam a ambos os clubes, a esta hora Villas-Boas ainda seria treinador da Académica.

PAULO SÉRGIO prepara-se para, no espaço de cerca de três meses, colocar duas equipas fora da Liga Europa. Julgo que estamos perante um especialista. Primeiro foi o Guimarães, afastado das competições europeias no último jogo do campeonato pelo Marítimo, e agora é o Sporting, que está prestes a ser eliminado pelo poderoso Brondby. Na mesma semana, o treinador do Sporting disse que tinha a melhor equipa do Mundo e perdeu em Paços de Ferreira, e depois disse que o Sporting era favorito em todos os jogos e perdeu em Alvalade. Não me surpreende que a melhor equipa do Mundo perca em Paços de Ferreira. O que acho verdadeiramente estranho é que Anderson Polga consiga ser titular na melhor equipa do Mundo.

OUÇO dizer que os jornalistas do Expresso captaram boas declarações de Pinto da Costa. Não li a entrevista, mas custa-me a crer que sejam melhores que as declarações que a Judiciária captou e ainda pontificam no YouTube. Sem querer beliscar o brio profissional dos jornalistas que, ao longo dos anos, têm entrevistado Pinto da Costa, é apenas justo referir que meia dúzia de polícias fizeram melhor jornalismo – e sem precisarem de colocar uma única pergunta. Quando se tem talento…

É impressionante o modo como Carlos Queiroz, um treinador cujas equipas praticam um futebol tão pouco emocionante, consegue despertar tantas emoções fora do relvado. Dificilmente se chegará a um consenso a propósito deste intrincado caso disciplinar. Quem tem razão? Queiroz? A brigada antidoping? As amostras de urina? É difícil dizer, sobretudo quando ainda ninguém concorda sobre a prestação de Portugal no Campeonato do Mundo. Foi boa ou má? É verdade que a Selecção só foi eliminada pela equipa campeã do Mundo, mas não é menos verdade que Portugal não consegui marcar um único golo a quartetos defensivos que não fossem formados por Ji Yun-nam, Ri Kwang-chon, Ri Jun-li e Pak Chol-jin. Todos os defesas que neste momento não se encontram em campos de trabalhos forçados revelaram-se intransponíveis para a estratégia ofensiva portuguesa. Sim, mas seria realista esperar que Portugal conseguisse a proeza sobre-humana de bater a Espanha? Bom, a Suíça conseguiu. Digamos que não era propriamente impossível. Creio que o grande problema da Selecção é que Carlos Queiroz só joga ao ataque nas entrevistas ao Expresso. No entanto, não sou daqueles que dizem que o futuro é negro. Se a federação conseguir arranjar maneira de suspender Queiroz até Agosto de 2012, julgo que Portugal tem boas hipóteses de se sagrar campeão da Europa.

15 agosto 2010

A andorinha e a Primavera - Por Ricardo Araújo Pereira

Por Ricardo Araújo Pereira in A Bola

O principal acontecimento desta semana deve ter intrigado a generalidade dos comentadores - quer os cronistas que escrevem colunas de opinião, quer os que preferem publicar opiniões que não são as suas com
o objectivo de interferir nos jogos espicaçando jogadores. O fenómeno é simples: a equipa que acabou de ganhar brilhantemente o campeonato passou a ser péssima no espaço de uma hora e meia. Não é fácil. Requer talento. A metamorfose do Porto, que se transformou na melhor equipa do mundo no mesmo lapso temporal, não é tão impressionante. É certo que, até ao passado sábado, a equipa do Porto era um conjunto de jogadores pouco ambiciosos, à imagem do amorfo JesuaIdo Ferreira, e precisava urgentemente de re
forços se queria fazer melhor que o justíssimo terceiro lugar em que tinha terminado a época. Mas só às segundas, quartas e sextas. Às terças, quintas e sábados, o Porto era uma equipa que, se não tivesse sido injustiçada pelas punições sofridas por jogadores inocentes que, coitados, se limitaram a participar em espancamentos, teria sido campeã com 30 pontos de avanço - ou não fosse treinada pelo competente Jesualdo Ferreira.
O próprio André Villas Boas que, além de ser o mais novo vencedor da Supertaça, é o primeiro treinador do mundo a usar por quatro vezes a palavra «exacerbação» na mesma conferência de imprensa - recordou, aliás de forma um pouco exacerbada, que o Porto do ano anterior só não tinha ganho por causa das injustiças, observação que constitui uma crítica a Pinto da Costa pelo despedimento de Jesualdo Ferreira, o que acaba por ser razoavelmente exacerbador. E é assim que a equipa que, ainda não há seis meses, levou três secos daquele Sporting que acabou a 28 pontos do primeiro, se encontra no topo do futebol português. Pelos vistos, no futebol, por morrer uma andorinha acaba a primavera. E por morrer um abutre acaba a exacerbação.

Quanto ao Benfica, se é possível encontrar algum aspecto positivo mo meio desta horrível hecatombe que foi o facto de termos perdido um jogo, talvez seja consolador registar que, num jogo em que tudo nos corre mal e não jogámos mesmo nada, o pior que nos pode acontecer é perdermos 2 - 0 com o Porto.

O Braga entrou na nova época com uma vitória clara por 3-I. À atenção do Porto: a luta pelo segundo lugar vai continuar a ser dura. Talvez não seja boa ideia voltar a emprestar jogadores ao principal rival em Janeiro. Fica a sugestão.

09 agosto 2010

O 27ª Mourinho respondeu ao primeiro, que ficou com as orelhas a arder - Por Ricardo Araújo Pereira

Por Ricardo Araújo Pereira in A Bola

Se houvesse dúvidas acerca da categoria de André Villas-Boas, elas dissiparam-se ontem. Trata-se de um treinador de nível internacional. Um técnico menor estaria empenhado a tentar perturbar o treinador do seu adversário de hoje no primeiro troféu da época, ou a tentar desestabilizar o outro candidato ao título, o Braga. André Villas-Boas não. Anda entretido a fazer mind games com o treinador do Real Madrid. Não duvido de que os merengues andem de cabeça perdida por causa das azedas considerações de Villas-Boas. «Villas-Boa es muy duro!», terá exclamado Jorge Valdano. «La Liga ya nos va correr mal!», terá suspirado Florentino Pérez.

A conferência de imprensa que o treinador do Porto deu ontem ficará na história do futebol. Primeiro, disse que concordava com o Special One: Villas-Boas e Mourinho não são clones. Depois, disse que discordava do Special One: Villas-Boas e Mourinho tinham quase o mesmo número de jogos como treinador principal antes de chegar ao Porto. Logo, afinal são clones. É um discurso que só está ao alcance das mentes mais complexas. A imprensa do Porto apressou-se a fazer a pesquisa que servia os argumentos de Villas-Boas e descobriu que, antes de ir para o Porto, Mourinho tinha apenas mais um jogo como treinador principal do que Villas-Boas. O problema é que Mourinho não falou em jogos como treinador principal. Falou em trabalho de campo. Antes de ser treinador principal. Mourinho foi treinador adjunto. Não foi observador de jogos, nem redactor de relatórios. Dizem que faz uma diferençazinha.

Como benfiquista, não posso deixar de estar preocupado com o jogo de hoje. Alem de ser orientado por um quase Mourinho, o Porto conta agora com João Moutinho, que no espaço de duas semanas deixou de ser um fiteiro contumaz para, segundo Rui Moreira, passar a ser um quase-Iniesta, e o Benfica limitou-se a fazer uma pré-temporada parecida com a da época anterior, o que significa que, tal como no ano passado, estamos todos imbuídos de um entusiasmo completamente injustificado. É certo que Miguel Sousa Tavares atribuiu o favoritismo da Supertaça ao Benfica, mas, depois de ter previsto a vitória da Argentina no Mundial, MST evidenciou perceber menos de futebol do que certos polvos alemães. Não há nada que nos acalme esta angústia.

Creio que o leitor se lembra da novela. Primeiro, Real Madrid e Barcelona digladiaram-se pelo jogador. Os catalães ofereciam milhões mais o Ibrahimovic e os madrilenos queriam troca por troca com o Kaká. Depois, Chelsea e Manchester United travaram uma luta muito feia para o contratar, com derramamento de sangue e tudo. Foi, por isso, com bastante admiração que vi o extraordinariamente magnífico Bruno Alves rumar a S. Petersburgo. Enfim, estes jogadores que têm o Porto no coração e que Pinto da Costa diz que vão ficar muito tempo só abandonam o clube se for para rumar a algum colosso do futebol europeu.

Quanto ao Sporting, a grande surpresa foi a ida de Miguel Veloso para o Génova. Que se terá passado? O Porto não estava interessado no jogador? É possível que Veloso fosse apenas uma maçã tocada, ao contrário de João Moutinho, que como se sabe já estava em estado de putrefacção. A ponto de certos adeptos do Sporting terem mesmo negado que Moutinho fosse um símbolo do Sporting. Absurdo. Recordo que Moutinho era capitão e tinha na camisola o número 28. Exactamente o número de pontos a que o Sporting ficou do Benfica. Se isto não é um símbolo, não sei o que é.

15 junho 2010

Jorge Jesus no Porto? Nem na Playstation - Por Ricardo Araújo Pereira


Por Ricardo Araújo Pereira in A Bola

(…) não tenho opinião formada (e quem poderá tê-la?)
[Sobre a contratação de Villas-Boas]
Miguel Sousa Tavares
A Bola, 8 de Junho de 2010


“É uma escolha fantástica”.
Rui Moreira
Antena 1, 2 Junho de 2010



A abordagem de Pinto da Costa a Jorge Jesus não resultou. Acontece. Por uma qualquer razão difícil de explicar, o treinador do campeão nacional não se mostrou interessado em ir orientar o terceiro classificado na Liga Europa. Enfim, nem todos os contactos do presidente do Porto podem ser tão bem sucedidos como aquele telefonema que manteve com o árbitro Augusto Duarte. E, além disso, é natural que os treinadores vivos desconfiem de um presidente que falha as promessas a treinadores falecidos. Benfiquismo à parte, foi pena. Sinceramente, gostaria de ter visto a equipa técnica que Jorge Jesus iria formar no Porto. Este adjunto que Pinto da Costa acabou de contratar podia ser um excelente ajudante de Raul José, Miguel Quaresma, Mário Monteiro e Pietra. Quem sabe se, no futuro, Villas-Boas não pode ainda integrar a equipa técnica de Jorge Jesus e aí demonstrar todo o seu celebrado talento para a observação e a estatística?

Tal como sucedeu nos processos de Domingos Névoa e Fátima Felgueiras, também o processo Apito Dourado terminou sem qualquer condenação por corrupção. O empresário Manuel Godinho, detido no âmbito de processo Faca Oculta, de quem se diz erroneamente que aguarda julgamento, na verdade aguarda absolvição. Os processos têm pontos de contacto notáveis. Fátima Felgueiras foi passar uma temporada ao Brasil, talvez no mesmo avião em que viajou Carlos José Amorim Calheiros, conhecido como Carlos Calheiros para efeitos de arbitragem e como José Amorim para fins turísticos. Por outro lado, enquanto Manuel Godinho oferecia peixe, Pinto da Costa oferecia fruta. Tudo víveres que devem fazer parte de uma alimentação saudável. Quanto mais não seja por semelhante elevação de princípios, não admira que não haja tribunal que se atreva a condenar esta gente.

Esta semana trouxe boas notícias e más notícias. A boa notícia é que Rúben Amorim foi chamado à Selecção. A má notícia é que foi chamado à Selecção portuguesa. Por um daqueles enormes azares, o rapaz não pode integrar uma equipa cuja categoria e ambição estejam à sua altura, infortúnio que partilha, aliás, com Fábio Coentrão. Que se apoiem mutuamente nesta hora difícil e voltem sãos e salvos, é o que lhes desejo. Até porque a equipa portuguesa continua a jogar um futebol desorganizado, com jogadores que parecem não saber o que estão a fazer em campo. Liedson, por exemplo, está de tal forma mal integrado na equipa que quem não soubesse até diria que é estrangeiro.

Depois de André Villas-Boas (sete épocas de Mourinho), Baltemar Brito (seis épocas de Mourinho) é o segundo adjunto do Special One a ser contratado para treinar um clube português. O Belenenses, sem capacidade financeira para sete épocas de Mourinho, teve de se contentar com seis. Além de que Baltemar Brito veste pior do que Villas-Boas, e não é ruivo. Nisto do futebol, a qualidade custa dinheiro, e tanto os fatos de bom corte como a coloração capilar têm um preço elevado, até pelos pontos que rendem no final da época. Segundo consta, o barbeiro de José Mourinho está nos planos do Trofense. Ora, na qualidade de cidadão que já trocou quatro SMS com o Special One, aproveito esta oportunidade para fazer saber ao mercado que não estou disponível para orientar equipas. Mas, ao que me dizem, o corta-unhas de José Mourinho vai mesmo treinar o Arrentela.

07 junho 2010

Síndrome José Mourinho: mais um caso de contágio - Por Ricardo Araújo Pereira

Por Ricardo Araújo Pereira in A Bola

Quem esteve atento à imprensa do Porto, esta semana, sabe que Pinto da Costa acaba de contratar o melhor treinador de todos os tempos. Dia após dia, Villas Boas foi sendo descrito nos jornais de modo a que ninguém tivesse dúvidas: Villas Boas não é o novo Mourinho; Mourinho é que, com esforço e sorte, poderá vir a ser o novo Villas Boas. Aqueles adeptos que, levianamente, tinham preferência por treinadores com mais de seis meses de experiencia, foram confrontados com páginas e páginas de informações detalhadas sobre o extraordinário perfil de Villas Boas e puderam confirmar que estavam a ser ridículos.

Porque Villas Boas é jovem. Vilas Boas é ambicioso. Villas Boas é extremamente moderno. Villas Boas ainda não parou de evoluir. Villas Boas é extraordinariamente jovem. Villas Boas é arruivado e chama-lhe cenourinha. Villas Boas é mesmo muito ambicioso. Villas Boas tem o número de telefone de José Mourinho na sua agenda. Villas Boas adora os jogadores. Os jogadores adoram Villas Boas. Villas Boas é mais jovem do que quase toda a gente. Villas Boas fez relatórios magníficos para Mourinho. Villas Boas é tão ambicioso que até faz dor de cabeça. Villas Boas quase nunca diz palavrões. Villas Boas dá conferências de imprensa de antologia porque antecipa as perguntas dos jornalistas e ensaia as respostas geniais que vai dar. Villas Boas uma vez falou com um jornalista num aeroporto e deixou-o muito bem impressionado. Até porque é jovem. E ambicioso. Villas Boas tem dupla ascendência nobre: é o 4.º visconde de Guilhomil e o 17.º novo Mourinho. Villas Boas sabe estar. Villas Boas lê os jornais todos logo pela manhã, o que é notável. Villas Boas sabe o que é o esternocleidomastoideu (esta informação não vinha na imprensa, mas julgo que apenas por esquecimento). Villas Boas não treina, orienta processos de treino. Villas Boas não dá instruções, incute conceitos. Sempre de forma jovem e ambiciosa. E foi certamente por tudo isto que, dos 50 nomes de treinadores que Pinto da Costa disse ter na cabeça, houve 49 que não tiveram currículo nem categoria para levar a melhor ao rapaz que nunca treinou numa competição europeia e deixou a Académica num glorioso 11.º lugar, dois pontos abaixo do Paços de Ferreira de Ulisses Morais.

Foi uma semana histórica. Certa capa de jornal colocava frente a frente os dois mais prováveis candidatos ao lugar de treinador do Porto e o respectivo resumo de carreira. De um lado, Muricy Ramalho. E, por baixo da fotografia, a legenda: «três campeonatos brasileiros e uma taça CONMEBOL». Do outro lado, Villas Boas. E, no lugar do currículo, vinha escrito: «7epocas de Mourinho». Era, portanto, o confronto entre um tricampeão do Brasil e um heptacampeão dos relatórios. Sem surpresa, ganhou o último. Como benfiquista, não posso deixar de estar preocupado e julgo que se devem tomar medidas drásticas: avançar para o despedimento imediato de Jorge Jesus e contratar a Sr.ª D. Matilde, a mulher do special one. Tem cerca de 20 épocas de Mourinho no seu palmarés. Parece-me jovem. Caso seja ambiciosa, leia os jornais todas as manhãs e prometa pintar o cabelo de ruivo, é oferecer-lhe um contrato de dois anos com mais um de opção.

Quem julga que exagero acerca das capacidades de Villas Boas não precisa de ler as reportagens da imprensa nortenha. Para se ter uma noção da importância que o novo treinador do Porto tinha na equipa de Mourinho, bastará recordar que, esta época, já sem a preciosa colaboração de Villas Boas, Mourinho ganhou apenas o campeonato italiano, a taça de Itália e a Liga dos Campeões. O leitor lembra-se certamente das célebres imagens de Mourinho agarrado a Materazzi, na despedida de Milão. Pois bem, neste momento tenho a certeza de que ambos a chorar com saudades dos relatórios de Villas Boas. «I rapporti! I rapporti!», chorava Materazzi. «Ma che saudadini!», soluçava Mourinho. «Era cosi giovani e ambizioso!», suspiravam ambos.
A culpa é do próprio Mourinho, que tem esta qualidade única. Os outros grandes treinadores do mundo não transmitem, por osmose, os seus conhecimentos ao resto da equipa técnica. Quem faz relatórios para Fabio Capello não passa a saber treinar como ele. Os adjuntos de Alex Ferguson não se transformam em treinadores geniais (como nós bem sabemos). Mas os que rodeiam Mourinho passam a perceber de futebol por contágio. São contaminados pela especialidade de special one. Pode ser o melhor treinador do mundo, mas é um perigo para a saúde pública.

29 maio 2010

"I gotta feeling" que a Selecção não desperta "feelings" - Por Ricardo Araújo Pereira


Por Ricardo Araújo Pereira in A Bola

Junto a minha voz à daqueles que se indignam por o hino oficioso da Selecção não ser uma canção portuguesa. Não por patriotismo, mas por coerência com a realidade: creio que a música mais apropriada para este nosso conjunto seria um fado. Antigamente, todas as janelas do País tinham de ostentar uma bandeira portuguesa, mesmo que tivesse pagodes no lugar de castelos. Agora, ninguém vai aos chineses comprar uma bandeira nem que tenha sido bordada à mão pela padeira de Aljubarrota e tingida com sangue de D. Afonso Henriques.

A verdade é que há sacas de batatas mais entusiasmantes do que Carlos Queiroz. Mais facilmente um brasileiro nos faz sentir portugueses do que ele. E, em certa medida, devemos estar-lhe gratos por isso. Com Scolari, o povo português andaria agora entretido a bufar nas vuvuzelas até ficar com as beiças em carne viva. Estaríamos a viver tempos insuportáveis. Elefantes viriam da Índia atraídos pelo barulho, julgando ter ouvido o grito de acasalamento de fêmeas gigantes, e procurariam fazer criação com os portugueses mais volumosos que encontrassem. Com Queiroz, a população da Covilhã em peso organiza-se para lhe comunicar que gostaria de o ver com uma vuvuzela, mas a sair do orifício errado. Compreende-se: por exemplo, Scolari tentou bater num estrangeiro, o que sempre galvaniza o bom povo. A única vez que Queiroz esteve tentado a dar uns bananos, escolheu um português. Isso tem sido uma espécie de imagem de marca: como se tem visto nos jogos, esta selecção não tem agressividade nenhuma frente aos estrangeiros.

Ora até que enfim que José Mourinho tem, em Portugal, o reconhecimento que lhe é devido. Não sei se ainda se lembram mas, há uns anos, alguns dos que agora rejubilam com a façanha do treinador português e só lhe vêem virtudes estavam a ameaçá-lo de morte. Um vice-presidente do clube ao serviço do qual ele ganhou a sua primeira Liga dos Campeões foi ao seu quarto na véspera da final passar-lhe o telefone, para que ele pudesse ouvir de viva voz uma mão cheia de insultos e ameaças. Parece que, desta vez, tal não sucedeu. Parabéns a José Mourinho pela sua segunda Taça dos Campeões, e a primeira que ele teve vontade de festejar. Sentiu-se que ele prefere assim.

“Nós vamos a partir de hoje aqui solenemente dizer-lhe (…) que nós queremos este ano dedicar a vitória do campeonato a si. A si, que vai ser campeão”.
Pinto da Costa
À conversa com ma fotografia de José Maria Pedroto
7 de Janeiro de 2010

“Eu não sou prometedor de títulos nem de nada, que não uso esse tipo de conversa”.
Pinto da Costa
27 de Maio de 2010

Este ano não tem sido fácil para quem já foi treinador do Porto. José Maria Pedroto, ao contrário do prometido, não ganhou o título deste ano, e Jesualdo Ferreira já sabe que não ganha o do próximo. Na origem de ambas as desfeitas está Pinto da Costa. Diz-se que o desnorte tem a ver com a má época do Porto, mas deve reconhecer-se que não foi tão desastrosa como se tem dito. Por exemplo, é mentira que os jogadores do Porto não vão disputar a Liga dos Campeões na próxima temporada. O Rentería, em princípio, vai.